DL: Filho de emigrantes açorianos no Brasil, nasceu no Rio de Janeiro, há 39 anos, mas quando era mais novo vinha aos Açores. O que recorda desses tempos?
Tenho memórias maravilhosas. Na verdade, o que me fez querer vir para cá foram essas memórias. Fui batizado na igreja de São Bento, na terra onde o meu pai foi criado. Depois vim já maior, com 12 anos, para as bodas de ouro da minha avó. A minha avó teve 13 filhos, então foi o encontro de dezenas de primos. Foi muito bom estar em família. Depois voltei várias outras vezes, em adolescente, a descobrir a vida e os Açores, um lugar seguro que pude desbravar. O grande marco na minha vida foi a Direção Regional das Comunidades ter me oferecido um curso para aprender a tocar viola da terra, para ajudar o grupo folclórico. Nem tinha ligação com a Casa dos Açores. O meu avô tinha sido presidente. Quando cheguei aqui, deparei-me com a cultura já um pouco mais maduro e apaixonei-me. Fui fazer o curso de História, ingressei na direção da Casa dos Açores. Depois, com as minhas próprias pernas, comecei a criar eventos na Universidade dos Açores, vir em trabalho, dar palestras, e o interesse de morar aqui ficou cada vez maior.
Aqui há uma alma muito parecida com a do carioca. Pessoas que recebem bem, há uma bela gastronomia, a cultura pulsante na Terceira, com muita música e festa. Gosto disso. É parecido com a minha cidade natal. O que me atrai mesmo aos Açores é a paz. As pessoas vivem num paraíso. Este é mesmo um lugar de encantamento, paz e segurança. Os Açores despertam paixões e como sou uma pessoa que gosta de viver apaixonada, vim para o lugar que me desperta paixões. As minhas paixões são os Açores, a minha esposa e as minhas filhas.
DL: Formou-se em História, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Está agora a terminar o seu doutoramento, também na mesma área. Porque decidiu seguir História?
Sempre fui uma pessoa bastante ligada à cultura. Sempre gostei de história, por conta da mitologia, e depois pelo lado social. Sempre gostei de memórias, de família, o que é que une as pessoas,a micro história. Fiz o curso que alimentava esse interesse e acabei voltando a minha formação para a minha ligação aos Açores. Sempre estudei emigração. É o foco da minha pesquisa. Estou a acabar o doutoramento, sou investigador convidado da Universidade dos Açores. Escrevo artigos, dou palestras, sempre com o tema da emigração, porque é o que gosto: porque é que as pessoas saem da sua terra natal; como é que são acolhidas. Geralmente o meu foco é a emigração açoriana, principalmente para o Rio de Janeiro, que é pouco estudado. Confunde-se com a minha história. Uso uma ideia de um projeto memorialista. A minha ideia sempre foi registar as memórias para as futuras gerações, porque estão a perder-se. É natural, as comunidades vão envelhecendo, a emigração para o Brasil cessou. Não queria só uma memória, queria um estudo historiográfico, algo com base científica, para que isso ficasse registado para sempre, saber que os açorianos são muito importantes no Rio de Janeiro e é uma comunidade diferenciada dos portugueses continentais. Os açorianos têm muitas particularidades, que nunca tinham sido estudadas, a não ser pela historiadora da Casa dos Açores, Judite Evangelho, que começou esse trabalho, mas não aprofundou. Essa é a minha missão académica.
DL: Faz parte da direção da Casa dos Açores no Rio de Janeiro. Quais as suas tarefas?
Sou diretor cultural da Casa dos Açores do Rio de Janeiro há 15 anos. Criamos eventos, atraímos pessoas e fazendo o máximo para divulgar a cultura açoriana no Rio e para os açorianos se sentirem em casa, porque esse é o foco da Casa dos Açores. Fiz protocolos com várias universidades, trazendo um lado mais académico e tornando a Casa mais conhecida. Hoje ela já é um polo de açorianidade, misturada com a cultura carioca.
A primeira de todas as Casas dos Açores foi a nossa. Tem 71 anos. Depois tivemos a de São Paulo, a de Santa Catarina, a de Rio Grande do Sul e a do Maranhão, a do Espírito Santo, a da Baía. Estamos espalhados naquele continente todo.
Só há Brasil por causa dos Açores. A primeira emigração para o Brasil foi de casais açorianos para defender o Maranhão dos franceses. O território brasileiro é o que é por causa dos açorianos que deram a sua vida lá.
DL: Já no Brasil desenvolvia projetos educacionais, com a sua esposa. Acreditam na transformação pessoal através da educação?
Quando saí da Força Aérea Brasileira, onde trabalhava como historiador — fui chefe de setor, a nível Brasil, coordenando projetos culturais — começamos a focar mais na empresa que tínhamos criado. Criamos projetos que transformam a vida das pessoas por meio da educação. Por acaso, vim para cá para ser professor (talvez) mas encontrei na rede Valorizar o lugar que conectou a minha formação e a da minha esposa- que é pedagoga- com o nosso desejo de ajudar as pessoas. A Valorizar serve para as pessoas completarem os seus estudos, mas também para dar cursos de empregabilidade e tentar a inserção social. Vim para cá e consegui ajudar as pessoas, e por meio do nosso trabalho e da educação, fazer a diferença, com carinho e tratando as pessoas como seres humanos. Tem sido diferencial, temos feito não só alunos, mas também amigos. Estou muito feliz. Faço tudo com a minha esposa. Criamos projetos, dinâmicas. Temos vários tipos de clientes e ainda trabalhamos para o Brasil. O Centro de Qualificação e Emprego pediu para criarmos o projeto “Autonomia”, que vai começar agora, para tentar ajudar as pessoas a acreditarem mais no trabalho e em si. Já temos outras encomendas para dinamizar, de forma divertida. Achamos que aprender deve ser divertido.
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Comentários
Gostei bastante de saber um pouco mais sobre a importância dos açorianos para a cultura brasileira!