Log in

Pode um jornal ser sustentável e livre?

Fizemos a pergunta à diretora do jornal mais antigo do país, a académicos e a até a um ambientalista. Obtivemos respostas diferentes mas todos concordam que o Estado deve intervir com mais apoios aos órgãos de comunicação social devendo estes ser considerados um bem público

Entrevistados consideram que órgãos de comunicação social devendo estes ser considerados um bem público © DIREITOS RESERVADOS

Mas afinal, pode um jornal ser livre e sustentável? A pergunta é curta e simples. Mas a resposta pode não ser taxativa e tende a ser complexa. Paula Gouveia, diretora do Açoriano Oriental (AO), o jornal mais antigo do país, responde que “é o ideal” ser-se “sustentável  e livre. Acho que isto apenas depende dos jornalistas e da sua direção editorial”, considera a jornalista. Ainda assim, reconhece que a atingir a sustentabilidade “é uma situação mais complexa”. E aqui, por sustentabilidade, falamos da económica. Da ambiental, já lá iremos. Para a diretora do AO, a sustentabilidade acaba por influenciar diretamente o raio de ação de um jornal. “Se não houver meios financeiros que permitam essa sustentabilidade, naturalmente que isso vai se refletir na redação, não só ao nível dos salários que se pagam, do número de jornalistas que se pode ter, das investigações que se podem fazer, no fundo tudo aquilo que depende do trabalho editorial”, reflete a diretora. 

Luís Santos é diretor adjunto do centro de estudos de comunicação da Universidade do Minho, o maior do país. Para o docente e investigador, a resposta à pergunta deste artigo, é “não é”. Ou seja, não é possível ser-se sustentável e livre sobretudo porque o setor “tem um modelo que está a sofrer um desgaste enorme há pelo menos 20 anos. A primeira conclusão que se pode tirar é que não vai para melhor, não há volta, não há retorno neste atual modelo”, considera. “Nesta altura já serão muito poucas as pessoas que têm essa ilusão e se a tiverem, estão enganadas”, diz Luís Santos. O responsável não tem dúvidas de que é preciso mais apoios do Estado aos órgãos de comunicação social. “Se se decidir que o jornalismo é um bem público, da mesma forma que se decide que o acesso à água é universal, se nós decidirmos que para a saúde dos nossos regimes é importante que exista jornalismo de qualidade, plural, com ideias muito diferentes, se nós decidirmos que isso é importante para a saúde das nossas sociedades, então o Estado deve apoiar a atividade jornalística”, defende o investigador. E dá exemplos: “há países que já experimentaram soluções indiretas, que é em vez do Estado apoiar as empresas, o Estado apoia os cidadãos e os cidadãos escolhem apoiar uma empresa. O Estado só apoia a empresa se a empresa criar com aquele dinheiro mais empregos e se com aquele dinheiro fizer mais jornalismo de investigação autónomo, ou seja, não jornalismo de agenda”. Ou então através de “bonificações fiscais” ou de “apoio, de forma mais direta, do mecenato”.

“A publicidade migrou para outras plataformas”

Para a docente e investigadora da Universidade Católica, Isadora Fonseca, o atual modelo económico dos media necessita de mais Estado nele. “A sustentabilidade da imprensa local e da imprensa regional depende e deve assentar num modelo de subsídios e de apoios por parte do Estado, como acontece na Suécia, na Dinamarca e na Holanda, porque nós sabemos que o jornalismo é fundamental para o debate público em democracia. E eu creio que o caso português, que Portugal deve ter subsídios, apoios públicos que contribuam para a sustentabilidade, em especial dos media locais e regionais”, considera a investigadora. Isadora Fonseca, “não diria que o atual modelo não é sustentável” mas a transição para o digital trouxe muitos desafios de sustentabilidade económica”.

Paula Gouveia também concorda que é preciso mais ajudas ao setor. “A publicidade migrou para outras plataformas, já não depende tanto dos meios de comunicação social. Tudo isso exige novas soluções, novos modelos de financiamento, exige repensar como é que podemos ter jornais sustentáveis, exige repensar como é que podemos garantir a sobrevivência dos jornais que ainda existem. Tenho verificado que ao longo do tempo, por exemplo, algo que era considerado um escândalo, haver apoios públicos aos jornais e portanto aos media privados, neste momento há uma maior aceitação dessa ideia”, considera a jornalista. Para a diretora do AO, “a sociedade está consciente de que de facto há um problema e que sem uma imprensa livre e sustentável todos os desafios como os do populismo, de falta de tolerância, da desinformação, que são ameaças à democracia, tudo isso pode escalar”.

E como podem os jornais ser ambientalmente mais sustentáveis? Fizemos essa pergunta a Pedro Moura, engenheiro do ambiente e técnico superior do ambiente na Quercus. “Reciclar ou reutilizar o papel de jornal” é um passo importante na redução da pegada ecológica dos jornais. “Lembro-me de uma senhora que recebia um jornal local apenas para ter papel para forrar a gaiola do periquito. Isto é anedótico, claro, mas é uma forma de reutilização, portanto, se considerarem usos desse género, é uma forma de dar um uso ao vosso jornal após ele ter sido distribuído”, considera o ambientalista. Sobre a utilização de papel reciclado na impressão dos jornais, Pedro Moura, diz que as vantagens não são assim tantas “porque o papel quando é reciclado as fibras quebram e o papel fica mais macio e menos fácil de utilizar para folha de escrita. O papel reciclado em si não tem, para a utilização em escrita, grandes vantagens a nível ambiental”, alerta.

Sobre o fim dos jornais em papel, nenhum dos entrevistados pelo Diário da Lagoa acredita nesse vaticínio. Contudo, todos concordam que o setor está a mudar e quem nele trabalha tem de acompanhar as mudanças de consumo dos leitores e lutar por sobreviver num mundo cada vez mais digital e menos analógico.

avatar-custom

Sara Sousa OliveiraEditora executiva

Os leitores são a força do nosso jornal

Subscreva, apoie o Diário da Lagoa. Ao valorizar o nosso trabalho está a ajudar-nos a marcar a diferença, através do jornalismo de proximidade. Assim levamos até si as notícias que contam.

Deja una respuesta

Tu dirección de correo electrónico no será publicada. Los campos obligatorios están marcados con *

CAPTCHA ImageCambiar Imagen