Com a memória presente das gravações que a mãe lhe fazia aos dois anos de idade, já a cantar, Helena deixa bem realçada a vontade de continuar a sua formação nesta área. No conservatório foi onde aprendeu a técnica vocal e a dar uso à voz. Foi para a Universidade dos Açores para o curso de Relações Públicas e Comunicação e de seguida para a Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo, no Porto. Alemanha foi o país onde, durante oito anos, decidiu continuar os seus estudos acabando por fazer a sua licenciatura e o mestrado em ópera em Hamburgo. O sol, o bom tempo e a boa energia de Portugal, foram as principais razões que num dia, enquanto estava a ir para o teatro na Alemanha, com um casaco comprido, cachecol, botas e guarda-chuva, decidiu voltar para Portugal. Foi por cá que tirou um doutoramento em Performance na Universidade de Aveiro.
DL: Como começa a sua história na música?
Desde que eu me lembro, sempre gostei de cantar. Era coisa que sempre se fazia lá em casa. Durante as tarefas, enquanto se lava a louça, quando se varre a cozinha. Nós tínhamos o hábito de cantar lá em casa e fazer harmonias entre nós. Eu cresci no folclore. A minha mãe é ensaiadora aqui do Grujola, o grupo Folclórico do Rosário da Lagoa e portanto, cresci no meio da música. A primeira vez que eu me lembro de cantar em público, foi aos quatro anos, acompanhada pelos músicos do Grujola no teatro de Água de Pau.
DL: Porquê a ópera?
Foi pela dificuldade em si, pelo desafio. Tinha de fazer teatro, tinha de cantar. Quando a ópera apareceu há 500 anos atrás, não havia microfones. Ou seja, a técnica vocal que nós temos de usar para cantar ópera, que se chama canto lírico, obriga a que nós tenhamos um controlo muito grande da nossa voz, ao ponto de conseguirmos ter um volume que permita ser ouvido num teatro sem microfone, enquanto uma orquestra toca. Isso para mim é muito mais desafiante do que ter um microfone que apanha qualquer som que eu possa fazer. A ópera como tem uma técnica vocal muito mais desafiante e muito mais abrangente, foi aquela que acabou por me motivar mais.
DL: Sempre olhou para a música e imaginava um futuro?
Não. Em criança não sabia que a música podia ser um futuro. Agora é mais fácil para quem está no conservatório perceber que há possibilidade de seguir carreira na música. Mas no meu tempo isso não se pensava. Os meus pais colocaram-me no conservatório como um passatempo. Nunca lhes passou pela cabeça que um dia eu iria dizer “olha, afinal existem cursos superiores de música e eu quero ser músico de profissão, eu quero ir para fora”.
DL: Qual é o conselho que poderia dar a um jovem que quer seguir uma arte, neste caso a música?
As pessoas têm de pensar se é algo que elas precisam para a sua vida. Se fazer música, ou se fazer escultura, é algo que tu precisas de fazer para seres feliz. Se precisas daquilo para viver, ser feliz, estar bem contigo, eu acho que tu encontras sempre uma forma. Se calhar nunca mais voltar à tua ilha, mas tu encontras uma forma de conseguir fazer isso. Tens de te dedicar, tem de haver muita disciplina, tem de haver muita entrega àquilo que se faz e muito sacrifício à nossa volta, mesmo a nível familiar, às vezes é muito difícil gerir uma família quando se tem uma arte, uma coisa que ocupa a nossa vida. Tem de ser uma paixão a sério.
DL: Acha que a ópera tem se valorizado ou desvalorizado com o passar do tempo?
Eu acho que nós estamos a cometer um erro muito grande, no geral. Não só cá, mas em muitos sítios. Não estamos a dar oportunidade às crianças, aos jovens, de conhecerem esses tipos de arte. Não estamos a levar a arte à educação. Esperamos que as pessoas de si, quando se tornarem mais velhas, venham ter connosco, e isto é um problema. Eu nunca vi uma criança ir à ópera e dizer que não gostou. A questão está em se nós estamos a contribuir para isso ou se estamos simplesmente parados a querer fazer grandes pressões à espera que as pessoas venham ter connosco.
DL: Considera que, na ilha, regra geral, não se tem por ambição, viver da música?
As pessoas cá não têm o mesmo acesso à arte como se tem lá fora. Um pai que seja de fora, um adulto que tenha crescido e vivido lá fora, vê a arte acontecer à sua volta, vê mais que aquilo que nós vemos cá. Ainda estamos muito atrasados em relação a Portugal continental e a outros países europeus. Os pais hoje em dia, que têm filhos que vão para a universidade e poderiam escolher teatro, música, artes em geral, estes pais não cresceram num meio em que as artes eram uma coisa facilitada, portanto é normal que se sintam inseguros. Um pai que viveu cá toda a sua vida e que não vê a arte a acontecer à sua volta, vai temer pelo futuro do filho. Os meus temeram pelo meu.
DL: Quais são as maiores dificuldades que encontra nesse caminho?
É preciso mesmo muita disciplina, manter-me focada e disciplinada, é muito difícil. É preciso mesmo um trabalho mental para tal e depois, a fragilidade do próprio instrumento – e eu deparei-me muito com isso aqui [na Lagoa] na Traviata. Num espaço de um mês eu tive COVID e gripe A e estava completamente rouca. A primeira vez que consegui cantar aquela ópera, do início ao fim foi no próprio dia da estreia. Foi extremamente stressante, é um instrumento muito frágil. Basta constiparmo-nos, não dormir bem, qualquer coisa e fica um espetáculo inteiro em risco.
DL: Próximos sonhos e aspirações?
Não é que eu não tenha necessidade de sonhar, mas eu sinto-me realizada quando estou em palco, quando estou a fazer esse trabalho. Eu gostava de poder trabalhar em condições mais profissionais, digamos, mais bem organizadas, mas isso não é possível ainda. Ainda estamos muito no início, já fizemos muita coisa para uma ilha tão pequena.
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Una Genia Helena Ojala pudiera cantar en Argentina Abrazo desde ARGENTINA