Fundada a 2 de fevereiro de 1887, a filarmónica Estrela D’Alva é a instituição mais antiga da cidade da Lagoa, mas a longevidade da banda de música não faz perigar a sua sobrevivência a médio/longo prazo, pois a estrutura está alicerçada no binómio experiência/juventude.
Dos seus cerca de cinquenta músicos, muitos são jovens, mas também existem alguns mais antigos, como o presidente e músico, João Arruda, que recentemente completou as bodas de ouro de união à Estrela D’Alva.
Tinha apenas sete anos quando começou a tocar e nem precisou de se inspirar no filme ‘A fuga das galinhas’ para perceber que na banda estava ‘A fuga das vacas’.
“Fui pelas mãos de meu pai que era sócio da filarmónica. Naquela altura os pais levavam os filhos. Comecei naquelas lides aos sete anos”, recordou, reforçando a convicção de algo que já sabia ir gostar: “Antes de ir para a filarmónica já gostava daquilo porque meu pai tinha lavoura e era uma maneira de ao domingo não ir para as vacas”.
João Arruda começou por “tocar trompa” e mais tarde passou para trombone de vara, “instrumento que toco até hoje”, disse, orgulhoso, pois foi trombone de vara que tocou na Banda Militar quando ingressou no serviço militar obrigatório. “Foi uma fase da minha vida que para aperfeiçoar e a partir daí não mais mudei de instrumento”.
Fiel ao trombone de vara e à filarmónica Estrela D’Alva. “Nunca a troquei por outra”, assumiu, embora “de quando em vez tenha dado algum apoio noutras filarmónicas, o que ainda hoje acontece”, acrescentou.
De músico a presidente foi um instante. “Fui presidente durante quatro anos numa primeira fase, mas por motivos de saúde tive de parar. Voltei há cinco anos para a presidência. E aqui estou, a levar uma vida dedicada à música e dedicada também a todas as lides que uma filarmónica encerra”.
Todo esse trabalho foi reconhecido através da homenagem que lhe foi prestada e que o deixou “orgulhoso” porque “é um sinal de que as pessoas estão satisfeitas com o trabalho desenvolvido pela equipa que lidero, onde cada um dá o melhor de si. Sinto-me lisonjeado por isso”, disse.
Com 50 anos de casa, João Arruda já viveu de tudo na filarmónica e é com propriedade que opta por não traçar planos a longo prazo. “É muito complicado projetamos a longo prazo porque as pessoas estão cá por carolice e os jovens, a maior parte deles, estão de passagem porque ingressam no ensino superior, vão para fora e depois não têm como dar continuidade. Outros também têm trabalhos que não lhes permitem manter a regularidade desejada. Por isso, vamos andando dia a dia e projetamos o futuro a curto prazo”.
Uma coisa é certa: as dificuldades fazem parte da história da Estrela D’Alva. “Uma filarmónica é como uma família: tem momentos bons, outros menos bons, mas os bons superam os menos bons. Há alturas que as pessoas estão mais viradas para as filarmónicas, noutras alturas nem tanto, mas isso depende muito de como as coisas evoluem. Lembro-me que quando entrei estava a emigrar muita gente e as filarmónicas perderam músicos. Depois veio o futebol e houve nova dispersão. Agora estão a voltar porque há muitos jovens com mais formação, formação musical, que veem nas filarmónicas um complemento à aprendizagem”, vincou.
Apesar da evolução dos tempos, João Arruda não esconde a saudade dos tempos antigos. “Antigamente não tínhamos muita escola, aprendíamos com os senhores de mais idade e ia para casa do senhor Manuel Piques aprender solfejo. Os senhores António Correia, Manuel da Ponte e João Medeiros Gata eram os de mais idade com quem aprendíamos música na filarmónica. Naquele tempo saíamos de manhã e regressávamos à noite. Era diferente porque fazíamos vários serviços ao longo do dia e havia muitos convívios. Era também uma forma de conviver. Recordo também com saudade a festa de Nossa Senhora da Estrela, que ainda fazemos. São recordações lindíssimas”.
Com ele também está António Ventura, igualmente homenageado pelos 50 anos de dedicação à Estrela D’Alva. Música e contramestre, é outra referência histórica da banda. “Comecei na filarmónica Estrela D’Alva aos dez anos e quando fui aprender música era uma forma de poder sair de casa. Meus pais nem queriam que fosse, mas como ia um grupo de quatro ou cinco da escola, lá deixaram”, recorda António Ventura.