Alexandra Manes
A taxa de risco de pobreza permanece a mais alta do país. Não vale a pena dizer que baixou em 2023, quando quase um quarto das pessoas que moram nos Açores continuam à beira da fome e da falência. Não vale de nada virem os políticos anunciar que estão a conseguir baixar os números, quando se fala em dormir ao relento, e quando ir às compras é contrair dívidas.
A pobreza, o risco da mesma, e as consequências nefastas para a nossa sociedade, são reflexo de décadas e mais décadas de ingerência, mas são também o resultado de uma estratégia de perpetuação das classes baixas. Ao populismo, interessa manter uma fatia da população no limiar da desgraça, para poder vender votos a troco de um apoio ao medicamento ou de uma redução ilusória da idade da reforma, que pode bem só chegar no dia de São Nunca, de tarde.
Recuemos ao começo do ano passado. O escritor Joel Neto anunciou uma obra que alertava para a realidade da pobreza insular. Jénifer, ou a princesa de França. Interessante novela sobre as consequências de se viver pobre, num bairro imaginário, que poderia ser um de muitos que preenchem a realidade do nosso arquipélago. Um encontro entre o olhar de uma classe média cada vez mais elitizada, e uma criança inocente, vítima de ter nascido na casa errada, que só queria ser feliz.
Existem muitos mais casos desses do que gostaríamos de imaginar. Joel também foi vítima de uma política sistémica, de se varrer os pobres para debaixo do tapete. Foi agastado por alguns ataques infelizes, mas aguentou-se e manteve a sua postura de denúncia da arruinada realidade de algumas partes das nossas belas ilhas.
Contra amigos e camaradas de outros tempos, sublinhe-se. Não muito diferente foi a recente atitude de Paulo Jorge Ribeiro, num artigo de opinião publicado no Diário Insular, e que não posso deixar de elogiar, por não baixar os braços contra o extremar do neoliberalismo económico e moral. É de neoliberalismo que falamos.
Mais de um ano depois de Jénifer, um relatório do Serviço Regional de Estatística dos Açores, remete para os tais 24.2%, de pessoas em risco de pobreza, anunciando que se baixou cerca de 2%, que é como quem diz que não se baixou quase nada, e que ainda estamos muito longe da média nacional. E mesmo essa média não é famosa, nem deve ser motivo de orgulho. Basta haver uma família em risco de pobreza, para ser demasiado. E isso, começa nos gabinetes de gestão.
Politicamente falando, o neoliberalismo é um cancro que se espalha entre as altas estruturas do poder, e impede que sejam tomadas posições verdadeiramente úteis para o desenvolvimento de uma sociedade igualitária. É a partir desses tumores que a imoralidade se espalha à educação e à cultura, promovendo-se uma separação de classes, onde uns podem ter tudo, e outros não devem ter nada. Na saúde, essa distinção caminha para a sua construção, com a constante conversa de que precisamos de rever o sistema nacional. Pois precisamos! Precisamos de lhe dar condições para atender a todas as pessoas que precisam dele.
A pobreza é uma doença, daquelas que convém que não haja cura, para se poder continuar a vender medicação cara. Os partidos do arco da atual governação batem-se publicamente pelo apoio aos mais necessitados, mas depois reúnem à porta fechada com os grandes empresários, para organizar uma estratégia que mantenha uma boa parte das açorianas e dos açorianos amarrados a essa algema que é o mercado e a famosa mão invisível.
A coligação quer convencer o arquipélago com papas e bolos, mas os planos que afirmam preparar já deviam estar a ser aplicados e nem sequer são conhecidos. O que foi conhecido foi a sua postura perante os mais necessitados, votando a favor da tenebrosa medida do partido do senhor Ventura, para impedir que os mais pobres tenham acesso por igual à educação das suas crianças, construindo uma nova sociedade de classes, desde o nascimento, passando pela Creche, e até à prematura morte dos que vivem debaixo do risco dos tais 24.2%.
Não conheço a Jénifer, mas conheço demasiadas Jéniferes. Cresci numa ilha com problemas de igualdade económica e social. Cruzei-me com muitas outras realidades parecidas, em todas as ilhas dos nossos Açores. Vejo-a aumentar, com o cancro a espalhar-se entre nós. As gravatas que nos comandam assim o desejam. Mas não nos esquecemos de votar e de continuar a lutar, porque é preciso não esquecer o cântico negro, e saber que não é este o caminho pelo qual queremos ir.
Alexandra Manes
O regresso às aulas é tempo de reflexão para pais e filhos, adultos e jovens. É altura de saudosismos dos que se recordam dos dias passados nos recreios, entre os livros, os apontamentos e a folia de não ter responsabilidades. E é também altura de relembrar as instalações antigas, insuficientes, onde passávamos frio de estremecer no Inverno e calor assolador no Verão.
É tempo de recordar a falta de professores, colmatada de forma perpetuamente insuficiente, e incapacitada. E a ausência de auxiliares de educação, nos corredores desertos de uma escola sobredimensionada, afastando as crianças das suas freguesias, de onde só restam corredores vazios e promessas vagas.
Terão sido essas memórias de outros tempos, agora que a atual secretária, que tutela a Educação, se revelou a salvadora da Educação nos Açores? Numa primeira análise, e conforme atestaram as últimas eleições regionais, poderia parecer que tudo navegava com bom vento nas escolas do nosso arquipélago. Muitas pessoas decidiram-se publicamente pelo anuir com as políticas deste governo, naquele setor. A imagem de marca pareceu positiva, e a secretaria fez por assim a manter.
Mas sempre chegará o mês de setembro, altura do ano em que nem a melhor máquina de propaganda poderá salvar a máscara que a senhora secretária colocou sobre a educação regional. Sucederam-se notícias em vários jornais locais, apregoando uma realidade escondida de muitas e de muitos, mas sabida por quem passa por ela. A Educação não foi salva. Foi apenas reabilitada, e adaptada ao novo normal deste aparelho político-partidário.
Comecemos por uma carência evidente, transversal às nove ilhas: faltam pessoas para trabalhar no auxílio escolar. Aquelas ocupações que agora se designam por assistentes operacionais, outrora batizadas com outros nomes, e que são fundamentais para o funcionamento de qualquer escola. São cerca de duzentas vagas em todo o arquipélago.
Duas centenas de postos de trabalho que correm o risco de ficar por preencher pela intransigência do modelo estratégico de Sofia Ribeiro, que afastou oportunidades nestas áreas, e permitiu a criação de graves deficiências. Correm atrás do prejuízo, anunciando que serão vagas a preencher com recurso aos programas de emprego e aos estágios.
Formam-se novas gerações de precários. O governo de Bolieiro recua, uma vez mais, na palavra que deu.
Outra realidade comum é a de falta de estruturas em condições. Edifícios que necessitam de intervenções, humidades e débeis alicerces, com piores recursos do que nunca e total falta de manutenção. Escolas instaladas em espaços históricos, abandonadas ao vento.
Complexos escolares novos, que já revelam incapacidade de dar resposta ao que lhes é pedido. Orçamentos, como o da escola na Lagoa, onde a verba total para tomar conta dos espaços é insignificante.
Condições profundamente indignas, onde não há papel higiénico, lâmpadas, projetos, materiais de laboratório ou simples marcadores. De tudo um pouco se encontrará, se se souber procurar. Talvez seja falta de pergunta por parte dos jornalistas, uma vez que tal parece ser a única maneira de resgatar algum comentário à Secretaria em questão.
Não podemos deixar de recordar as faltas de professores que agora são tornadas públicas. No Corvo, quatro vagas podem parecer pouco, mas numa ilha com responsabilidades pedagógicas muito específicas, rapidamente correm o risco de criar uma bola de neve capaz de afetar toda uma geração de alunas e alunos.
Na ilha vizinha, as Flores lidam com uma dura realidade. Para além do encerramento de turmas e outros problemas do passado que já referi, perpetuamente ignorados e empurrados para debaixo do tapete, o novo ano letivo trouxe um problema de cinquenta e seis vagas na sua Escola Básica e Secundária. Um número verdadeiramente apocalíptico, numa escola que deveria contar com oitenta e seis docentes, mas que na verdade nem sequer apresenta uma pessoa que seja para o agrupamento de biologia e geologia, ou apenas uma para português ou para história. Quem lá viver e desejar seguir essas áreas, pode ter a certeza de que a solução não virá de quem manda.
Trata-se de um problema de trampolim, como tão bem nos relatou Francisco Maciel de Freitas. Os professores inscrevem-se naquele estabelecimento, mas nem sequer são obrigados a lá lecionar um ano que seja, antes de poderem solicitar destacamento noutra ilha. E as Flores permanecem, esquecidas por Bolieiro e pela sua equipa, votadas à solução da Bolsa de Emprego Público, incapazes de admitir a dura realidade de que se trata de uma questão política, reflexo de um executivo que não deseja criar condições de atratividade para as ilhas pequenas, que almeja largar.
Nem tudo está bem na Educação. Diria, aliás, que muito mais é que o nos doí do que aquilo que nos une. Durante os primeiros anos da sua governação, foi evidente a tentativa de capitalizar as inseguranças e os descontentamentos de uma classe que se sentia abandonada. Só que agora revela-se claro qual terá sido o verdadeiro plano em ação. Centralismos, promessas por cumprir e elitismos estratégicos que deram muitos votos, só que prejudicam as escolas, atacam diretamente as periferias, e colocam em risco o futuro da unidade e da igualdade no nosso arquipélago.
Nem tudo vai bem no reino daquela área.
Termino este texto lembrando que a Educação não pode ser gerida unicamente do ponto de vista sindical, e, citando Sérgio Nascimento, aquando do encerramento do Congresso Insular Olhar o Futuro Educação, Cérebro e Mente realizado na ilha Terceira, que de forma assertiva afirmou: “Os agentes de mudança não são as organizações, são cada um de vós. São as pessoas.”. Seria bom que o Governo Regional entendesse o seu papel.
Alexandra Manes
O que pensam os partidos de direita sobre cultura? A ignorância nesta matéria torna-se cada vez mais trágica, principalmente numa altura em que o país conta com os seus destinos entregues a quem parece não saber o que significa tal palavra.
Sem cultura, não há identidade. Sem identidade, não há pensamento livre. Sem pensamento livre, não há futuro. E é esse o caminho que a Aliança Democrática vai traçando, lá como cá. Bolieiro já nos explicou o que considera valer a cultura.
Depois das comédias passadas, é com o bailinho da verba em orçamento, mesmo tentando misturar tudo com a educação e o desporto, que qualquer olhar mais atento percebe que para a cultura não vai nada, nada, nada.
Hoje é sobre património cultural que me importa escrever. Em pleno coração do Património Mundial, no centro classificado de Angra do Heroísmo, em lote adjacente à Sé Catedral, na Rua da Rosa, localiza-se o Palácio Bettencourt, imóvel de interesse público, centenário e com um valor patrimonial de destaque no que ainda resta da cidade pós-sismo de 80. As suas origens parecem estar meio perdidas na neblina dos séculos, mesmo que se saiba que no século XIX era já um edifício de destaque na paisagem urbana.
Este nobre edifício que já teve vários usos, nomeadamente o de Biblioteca Pública e Arquivo de Angra do Heroísmo durante mais de sessenta anos, necessita de obras na expectativa de que seja dignificado com uma utilização que todo o seu valor lhe permite.
Ao ler um artigo de Isabel Soares Albergaria, publicado a 1/5/24, no Açoriano Oriental, fica claro de que houve a intenção de que se desenvolvesse um projeto de musealização desse palácio, adaptando-o a um programa de artes decorativas, projeto esse que chegou a ser formalizado em 2021 pelo Museu de Angra do Heroísmo. Alguém sabe da resposta a esse projeto?
O que soube foi que a sra. Secretária da Educação, Cultura e Desporto terá decidido que era ali que iria instalar a sua Secretaria Regional, avançando com obras no sentido de requalificar os espaços.
Empreitadas no centro de Angra, com grandes gruas e camiões de betão, já todas as pessoas se habituaram a ver. De vez em quando, para pequena vitória dos patrimonialistas, lá aparece uma que é devidamente acompanhada. Mas, segundo o que me fizeram chegar, não é este o caso. A obra na Rua da Rosa é promovida pela autoridade máxima da cultura regional, e, pelo que se apura por aí, não conta com fiscalização e proteção do seu património histórico ou arqueológico.
É, provavelmente, uma das maiores desgraças dos últimos anos. Até posso compreender que uma profissional da área da educação não perceba o crime que se pode cometer ao avançar com esses trabalhos sem o devido acompanhamento, mas nunca poderei compreender os motivos que levam a avançar, sem impunidade nem consulta dos técnicos verdadeiramente competentes que integram o quadro da direção regional.
No Pico, acaba de fechar uma parte do Museu do Vinho, por falta de condições. Na Horta, chove na Casa Manuel de Arriaga. Em São Miguel, sobrevive-se sem reservas e condições. Nas Flores, há muito que se aguarda verba para dar dignidade aos seus Museus. Em Santa Maria, um núcleo construído há pouco tempo prepara-se para ruir a qualquer instante. E tantos outros exemplos que ficam esquecidos para que se possam avançar com o Palácio Bettencourt. Demasiados, para o que se pede a quem trabalha na direção regional de Cultura.
Enquanto avançam as obras no Palácio Bettencourt, e os colegas vão sobrevivendo com baldes de água e esfregonas, a Secretaria nem se digna a salvar o que resta daquele património. Da Divisão de Serviços do Património não se conhece pronúncia oficial. Por este andar, da cultura, qualquer dia, só restarão vaidades e fachadas.
Alexandra Manes
Corria o ano de 2013. Portugal vivia tempos desesperantes, apertado pelo garrote da Troika e asfixiado pelos passos mais troikistas de um governo impositivo. Numa semana daquele ano, foi noticiado um alegado caso de violência doméstica, que nunca ficou bem provado ou desmentido. O jornal O Crime deu à luz uma série de acusações sobre o então primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, que ainda hoje não se sabe se foram ou não encomendadas.
Sabemos, todavia, que naquele tempo as pessoas suspiraram e não quiseram acreditar que tal pessoa fosse capaz disso. Com todos os defeitos que algumas pessoas lhe reconheciam, Passos Coelho era visto como um homem de fibra moral, e, portanto, não se colocava a hipótese de ter levantado uma mão para magoar qualquer esposa ou companheira de vida.
Passaram mais de dez anos desde o episódio caricato, que acabou esquecido pela neblina do tempo. Coelho deixou de ser primeiro-ministro, deixou os holofotes e, a certa altura, pareceu estar reformado da vida política.
Não sabemos se foi uma coincidência infeliz, ou uma propositada ação concertada. O que sabemos é que, alguns dias depois da eleição de cinquenta deputados para o partido da extrema-direita nacional, Passos Coelho voltou a público para fazer a apresentação de um livro de propaganda ideológica digno de Marcelo. Neste caso, de Marcelo Caetano, ainda que se possa inferir que Rebelo de Sousa também concorde com muito do que o tal livro afirma.
Identidade e Família é o título de uma obra que mistura comunismo, homossexualidade, interrupção voluntária da gravidez, donas de casa e muitas outras coisas que tal. É um delirante ensaio de conservadorismo, reflexo de um mundo que vive agarrado às publicações chalupas de redes sociais, promovido por algumas das mais bafientas figuras do salazarismo. Perdão. Do passismo.
Passos apresentou a obra e apareceu ombreado com André Ventura, que defendeu como sendo uma solução pragmática para o futuro da direita em Portugal. Essa postura só surpreendeu quem seletivamente decidiu esquecer que a rampa de lançamento do partido de Ventura foi precisamente Pedro Passos Coelho. Dias depois, o antigo primeiro-ministro veio criticar o seu antigo número dois, Paulo Portas, e lançar suspeitas de fraqueza para cima do governo do atual primeiro-ministro e antigo discípulo do passismo, Luís Montenegro.
Este é o mês da Liberdade. Passaram-se cinquenta anos desde a madrugada que todos esperávamos. Cinco décadas desde que Natália Correia chegou a casa naquela noite escura e recebeu uma chamada que mudou o nosso destino. A mesma Natália, que do seu Botequim ajudou o relacionamento de Sá Carneiro com Snu Abecassis, à revelia da esposa dele e dos seus amigos conservadores. Sá Carneiro, figura idolatrada pelo mesmo partido social-democrata que deu à luz o obscurantismo que Coelho agora nos vende. Que diria aquele casal, que floresceu na escuridão do bar, à revelia do tradicionalismo, ao ler a obra que Coelho promove?
Da Identidade e da Família, Coelho lançou-se ao ataque. Deu a mão à extrema-direita, mas manteve a sua postura alaranjada, para granjear os dois lados daquela maçã podre e galvanizar o país no lançamento da sua candidatura a Belém. É evidente que Coelho quer ser presidente de um país onde Ventura seja primeiro-ministro e, a julgar por sondagens recentes, onde mais de metade dos portugueses nem se importe de ficar sem eleições, desde que tenha um líder forte.
Mas voltemos ao livro e ao seu conteúdo. A defesa da chamada família tradicional por aquela obra de ideologia do género masculino, passa pelo branqueamento da narrativa e dos dados. Durante a discussão da mesma, falou-se de violência doméstica, alegando-se que a mulher que apanha e não reclama é porque gosta. Falou-se do papel da senhora, recatada e no lar, enquanto o homem pode sair para apanhar uma bebedeira, arranjar três ou quatro amantes e voltar para casa, com batom na gravata, e sem barulho da parte dela.
É essa a família que a extrema-direita, de Ventura, mas também de Passos Coelho, endeusa. É nesse agregado familiar que se reveem, como senhores de um lar onde são imperadores. Também Trump, que Ventura e Coelho adoram, está agora a ser julgado pelo horrendo episódio em que alegadamente dormiu com uma modelo da Playboy enquanto a sua atual esposa estava no hospital a dar à luz ao filho mais novo.
É esse o país que todos esses homens desejam. Com mulheres caladinhas e subservientes. Cabe a todas nós levantar a mão. Repetir a estalada na cara deles. Uma e outra vez. Até perceberem que a nossa identidade, a nossa família e a nossa alma não é deles. É nossa! E eles não passarão!
25 de abril, sempre!
Alexandra Manes
Findo este processo eleitoral, às legislativas nacionais, há, sem sombras para dúvidas, duas figuras que se destacam pelos resultados obtidos: André Ventura e Rui Tavares.
André Ventura pela subida exponencial no número de votos e pelos 48 deputados/as eleitos/as e Rui Tavares pelo aumento significativo de deputados/as conseguido, tendo passado de representação a grupo parlamentar, situando-se bem próximo do número conseguido pelo BE, por exemplo.
Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, na minha perspetiva, o maior derrotado da noite terá sido Luís Montenegro, pois não conseguiu o pretendido, nem tão pouco um aumento considerável de votos. Aliás, não conseguiu descolar-se verdadeiramente do conseguido pelo seu antecessor, Rui Rio, e sem CDS e PPM teria conseguido ainda menos.
Montenegro tem uma tarefa difícil pela frente, pois já percebeu que sem o apoio do chega não consegue governar. Ele sabe o dilema. Disse que “não é não” e caso retroceda na palavra terá traindo o seu eleitorado, tal como sabe que com o apoio e as cedências ao chega, o governo desmorona em meses.
Nem Montenegro sabe como vai convencer a máquina e as “forças vivas” do PSD de que é capaz de formar o “governo estável” que lhes promete. É que os apoios têm de ser recompensados, pois não há almoços grátis e Roma não paga a traidores.
A ingerência de Marcelo Rebelo de Sousa foi um erro crasso. Escolheu um lado e em dia de reflexão interveio, enviou uma mensagem encapotada e não o devia! O povo, a quem se fartou de beijocar, não lhe perdoará!
No fim da noite de domingo, Marcelo meteu-se no carro e foi para casa. Não quis falar à RTP. A golpada não lhe saiu bem. Fica com o Montenegro ao colo, mas vai ter que puxar por todo o seu engenho para descobrir o que fazer com o Chega. Foi um jogo de azar.
Por outro lado, Pedro Nuno Santos proferiu um bom discurso, assumindo o papel de líder da oposição, não atacando, nem ostracizando o eleitorado do chega, referindo que não há um milhão de portugueses racistas e xenófobos. Também não acredito que haja um milhão, mas ontem percebeu-se que há claramente quem se identifique com a ideologia que o chega preconiza.
O Bloco de Esquerda manteve o seu grupo parlamentar, tendo elegido três deputadas e dois deputados, dos quais destaco Marisa Matias pelo um trabalho de excelência feito no Parlamento Europeu, conhecedora de dossiers importantíssimos no que aos Direitos Humanos diz respeito. Uma mais-valia ao parlamento nacional, sem dúvidas.
Estou certa de que o BE, embora sem ter alcançado o resultado desejado, continuará a defender intransigentemente o Estado Social e a justiça social.
Relativamente aos deputados eleitos pelos Açores, a única novidade é a entrada de um deputado do chega que já deixou bem claro o que irá fazer no parlamento: gritar! Nada de novo, portanto.
Agora, mesmo ainda faltando conhecer os resultados dos círculos exteriores a Portugal e que poderão alterar o cenário, é hora de uma profunda reflexão interna, nos partidos de Esquerda.
Nunca a Esquerda baixou os braços ou virou as costas ao seu país. Não será agora!