“Os Açores são um ponto bastante maiúsculo no meio do Atlântico”

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O jornalista e escritor luso-brasileiro, Igor Lopes, esteve à conversa com o Diário da Lagoa (DL) a propósito do seu mais recente livro sobre o arquipélago, o “Açores em Cores”. Desvenda um pouco sobre a sua próxima publicação, fala de como ficou a conhecer os Açores e da relação entre duas realidades que tão bem conhece: a portuguesa e a brasileira

DL: Como surge a sua ligação com Portugal?
É uma ligação de sangue e de alma, diria. Nasci no Rio de Janeiro em 1980 e a minha família toda é de Portugal continental. A parte materna da família é de Armamar e a parte paterna é do distrito de Vila Real. Já pequenino me lembro de acordar no Rio de Janeiro, terra de samba, ouvindo Amália Rodrigues na vitrola, no andar de baixo da casa, com aquele cheirinho de comida portuguesa em casa. Eu sempre vivi nesse limbo da luso-brasilidade, já não me considero nem de lá nem de cá, estou nessa meiuca, nesse meio, como a gente fala no Brasil.

DL: Depois decide ir estudar para Coimbra.
Exato. Quando terminei a licenciatura em Comunicação Social, com habilitações de jornalismo, falei para os meus pais: eu preciso tentar a oportunidade de viver em Portugal, de sentir mais Portugal do que eu sinto aqui à distância. Tinha 23 anos e foi a melhor decisão que tomei. Fui viver para a zona de Lamego, Peso da Régua e de imediato, mal chego, encontro uma oportunidade profissional na minha área.
Fiquei até 2010, quando concluí o mestrado na Universidade de Coimbra. Depois volto para o Rio de Janeiro, fico alguns anos trabalhando em Comunicação e em algumas empresas ligadas ao Governo do Brasil e agora estou mais por Portugal continental, na Covilhã, fazendo doutoramento em Ciências da Comunicação.

DL: Como foi até escrever o “Açores em Cores”?
Eu sempre me dediquei a livros-reportagem, são livros jornalísticos que abordam um tema central, sempre conectando, no caso, Brasil e Portugal. Em 2017 venho aos Açores, pela primeira vez, a um congresso de jornalistas. Eu sou sincero, falei, ‘vou conhecer uma parte de Portugal que eu não conhecia’ e quebrei a cara porque isso aqui é o paraíso. Quando você chega aos Açores e vê as paisagens que o arquipélago tem, as características das ilhas, coisas que os brasileiros procuram a milhas de distância do Brasil, na Dinamarca, Suécia, em países nórdicos no geral. Aqui você tem isso a tão pouco tempo de distância do Rio de Janeiro, eu falei, eu tenho que escrever um livro sobre o arquipélago. Fiz o “Açores em Cores, belezas, contornos(?) e potencialidades” tentando divulgar para brasileiros luso-descendentes e açor-descendentes, a importância do arquipélago e as suas características principais para quem quer viver, trabalhar, estudar ou investir nos Açores. Entrevistei os principais líderes de vários segmentos justamente para mostrar que os Açores são pujantes e não ficam, de todo, condicionados à condição insular.

DL: Chegou a essa conclusão depois da investigação que fez para o livro?
Sim. Os Açores estão abertos para o mundo. Os Açores são um ponto bastante maiúsculo no meio do Atlântico.

DL: Sente que entre Portugal e o Brasil se está a fazer uma ponte com o seu trabalho?
Espero que sim. O meu propósito em todos os meus trabalhos jornalísticos e na literatura é conectar Brasil e Portugal. E olho os Açores com um carinho especial pela cultura que a gente observa nas Cass dos Açores no Brasil. É como um filho que merece ser mais olhado, mais acarinhado e é esse o momento que eu estou a viver.
A grande riqueza da língua portuguesa não é ela ser falada por 240 milhões de habitantes. O mais interessante é a diversidade dentro do mesmo quadro linguístico. Eu fico instando as pessoas que a língua portuguesa é uma única língua mas premiada por falantes de várias culturas.

DL: Como vê o futuro? Já há planos para um novo livro?
Já. Eu vou no quarto livro autoral e já tenho o quinto que está sendo impresso. Meio exclusivo, posso dizer que é um livro em que eu retrato as Festas da Agonia, em Viana do Castelo, para brasileiros e luso descendentes. É uma festa que acontece em Viana do Castelo que se vive no Brasil isoladamente. Explico o que é, a sua programação, falei com alguns responsáveis dos bastidores das festas. É um livro que tem o apoio da câmara municipal e a previsão é que em fevereiro a gente consiga colocar o livro nas ruas.

DL: De que forma a pandemia afeta um escritor?
Afeta, acho que, positivamente porque te dá tempo para você criar, escrever. Para mim a pandemia foi fundamental para pensar em novos temas, novos livros.

DL: Enquanto jornalista, como vê a imprensa entre o Brasil e Portugal?
Muito pouco conectados. Deveriam estar muito mais próximos. Podíamos ter uma unidade maior, em termos comunicacionais, literários e eu não vejo essa aproximação. Até há 10 anos você comprava um computador em Portugal com Windows em português sul americano. Hoje você já vê computador com a palavra ficheiro em vez de arquivo, que a gente usa no Brasil. Na imprensa, as pessoas não dialogam. Os jornalistas não dialogam. 

DL: Como se sente quem está no meio?
Eu tenho uma visão mais contaminada dos dois lados. Mas posso garantir que os brasileiros olham para Portugal com muito carinho. O brasileiro migra muito para Portugal procurando segurança e qualidade de vida mas também porque tem cá as suas raízes familiares. E Portugal olha para o Brasil como um filho. Basta os dois países se conhecerem mais. Portugal, em muitos locais do globo, continua a ser o país do bacalhau e do fado, e o Brasil, do samba e do Carnaval. E temos muito mais. Temos várias empresas operando dos dois lados do Atlântico com muito sucesso e é isso que precisamos de preservar e fortalecer.

DL: Se Portugal e o Brasil se juntarem a vários níveis, podem criar uma presença mundial mais forte?
Muito mais forte. Tem de ser uma união coordenada em busca de algo comum. Tem que ser feito um trabalho de fortalecimento do Mercosul, do enquadramento da União Europeia, para que Portugal e o Brasil possam ser um elo importante. O Brasil pode ajudar muito Portugal. A gente precisa mostrar que se conhece muito mas sabemos muito pouco sobre os outros. Esse é um trabalho que eu faço com muito prazer. O dia em que eu deixar de fazer isso, estou deixando a minha essência de lado.

Clife Botelho

Categorias: Entrevista

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