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“Eu sou professora”

11.07.2018

Eu sou professora. Há já algum tempo. E sou-o de profissão e de coração.

Desde que iniciei esta minha aventura que, na vida que se vive dentro das escolas, tenho visto um pouco de tudo… mas confesso que nunca vi tamanho atentado contra a justiça e os direitos das pessoas!

Todos os dias, estou e sou com os meus alunos. Na preparação das minhas aulas, procuro estratégias que possam conduzi-los a caminhos que não são mais do que atalhos para os seus futuros. Conheço os seus medos, os seus problemas, as suas dificuldades, mas também os seus dons e as suas qualidades! Invento mil e uma atividades, durante o ano, dentro e fora das minhas aulas, dentro e fora do meu horário letivo, que os façam sentir que contam, que são parte da escola, que têm valor. Procuro motivá-los, independentemente das condições que temos para trabalhar, independentemente dos problemas e das vicissitudes da nossa própria vida. Sim, porque nós, professores, também temos vida, sentimentos e situações que nos remexem por dentro!

E, aconteça o que acontecer, eu não desisto dos meus alunos.

Transmito-lhes, para além dos conhecimentos, algumas mensagens que considero muito importantes: o respeito pelo outro, a luta pela igualdade, a certeza de que, independentemente das nossas dificuldades e da nossa história, nada nos pode impedir de alcançarmos os nossos objetivos e de lutarmos pelos nossos sonhos. Há uma frase que sintetiza a minha filosofia de vida e que tento incutir na deles: marcar a diferença!

E a verdade é que tenho visto muitos dos meus alunos, outrora desorientados e sem objetivos de vida, a decidirem, afinal, lutar pelos seus sonhos e… marcar a diferença! E eu fico a vê-los, orgulhosa e feliz, por ter feito parte da vida deles, mais ainda quando me dizem que o fizeram porque eu os empurrei para isso!

A verdade é que sou daquelas pessoas que se alegra pelo sucesso dos outros e que deseja, de coração, que todos conquistem o seu “ lugar na vida ”. Na sua vida ! E, felizmente, tenho assistido a muitas conquistas!

Mas, nos últimos dias, tenho o coração negro. Quando eu, que ingenuamente, acreditava na justiça e nos valores que tanto promovo junto dos meus alunos, fui alvo, juntamente com toda a minha classe, de um verdadeiro atentado: retiraram-nos o direito à greve! E impõem serviços mínimos a quem dá o máximo todos os dias, como se fôssemos figurinhas no meio de um jogo qualquer e não vidas reais, tantas vezes atingidas pelas vidas dos outros, a lutar pelas vidas dos outros!

Não somos mais do que os outros! É verdade! Nem menos ! Ora, também por isso não compreendo por que razão a própria sociedade permite ou aceita que nos “ roubem ” anos de vida, anos de trabalho, de entrega, quando isso, só a nós acontecendo, é visto como normal.

Confesso que já passei por muita coisa. Já dei aulas longe de casa, noutra ilha, longe de tudo e de todos. Passei por escolas grandes e pequenas… conheci histórias cheias de luz e outras que me apertaram o coração… e, apesar de tudo, em momento algum, deixei de lutar pelos meus alunos e pelos direitos deles, sobretudo o de serem felizes, o que quer que isso signifique! E, em momento algum, deixei de acreditar que, onde quer que estivesse, tudo era possível.

Nunca pensei, no entanto, assistir a algo que considerava impossível: o desrespeito total, sobretudo por uma classe que é a base, o apoio e a força para aqueles que são o presente e o futuro. E a mensagem que o país lhes está a transmitir é assustadora!

Uma mensagem de que não podem nem devem lutar pelos seus direitos, porque imperam aqueles que inventam mentiras acerca dos professores e que os obrigam a calar-se, querendo fazer deles reféns, sem alma nem voz! Uma mensagem de que vale tudo e de que se pode tudo, mesmo que se desrespeite a essência do ser humano. Uma mensagem de que o dinheiro é para se gastar em estradas, BigBrothers e Casas dos Segredos, em atribuir subsídios a quem ganha por mês mais do que uma mão cheia de professores, em viver no “ faz de conta “ e no mundo da fantasia, quando nós, professores, todos os dias, lidamos com as vidas reais ( e nem sempre fáceis ) dos nossos alunos…

Temos sido ProSucesso, Flexibilidade, Compromisso Educativo. Temos sido cobaias de experiências educacionais que estão condenadas à partida, de mudanças de programas e de tantas ideias que nos têm como agentes, motores, alma! Mas a verdade é que somos lutadores. E o que se tem passado nos últimos dias tem mostrado precisamente isso! Nunca, no meio de tanta fraqueza, estivemos tão unidos e fomos tão fortes! O que me deixa orgulhosa!

Eu sou professora. E levo isso muito a sério! Para muita gente que não sabe o que isso é, e que julga que a nossa vida é uma festa e que está sempre tudo bem, impõe-se a reflexão. Impõe-se a tomada de consciência de que estamos todos os dias com os vossos filhos e que lutamos por eles, também todos os dias. Impõe-se refletir e perceber que esta luta que travamos, nesta altura do ano, não foi feita para prejudicar ninguém, muito menos os alunos, mas sim para repor direitos e contornar injustiças consagradas na lei e que foram publicamente reconhecidos por quem governa… até ao momento em que o dito virou promessa de circunstância, ou, para sermos mais claros, não dito !

Nunca foram e nunca serão os professores a prejudicar os alunos, a quem protegem o ano inteiro e por quem tanto fazem! Impõe-se a perceção de que bons professores formam melhores profissionais, melhores cidadãos e melhores pessoas!

Recuso-me, como sempre fiz ao longo da minha vida, a ceder àquilo em que não acredito.

Recuso-me a viver num mundo de mentiras e de faz de conta. Recuso, liminarmente, abdicar do direito à indignação!

Sei quem sou e o que tenho feito.

Eu sou professora. E não o quero ser sem marcar a diferença!

Por: Malvina Sousa

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