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O futuro da fábrica do álcool da SINAGA pode ser muitas coisas, mas uma coisa é certa: “Como está não pode ficar”

Historiadora Susana Goulart defende que a “degradação leva à inutilidade e a requalificação levará à vitalidade”

No âmbito da auscultação pública, é possível, até 31 de março, deixar um contributo em sinaga.pt © CM LAGOA

“Como está, não pode ficar”. Esse é um ponto assente, bem vincado pela historiadora Susana Goulart, que moderou o debate com especialistas e a comunidade sobre o futuro das instalações da fábrica do álcool. A razão é simples: “A degradação leva à inutilidade e a requalificação levará à vitalidade”, prosseguiu a especialista.

Para retirar da degradação as antigas fábricas da SINAGA do álcool (Lagoa) e do açúcar (Ponta Delgada), o Governo Regional dos Açores, em parceria com as duas autarquias e a Ordem dos Arquitectos, está a promover uma auscultação pública sobre a requalificação das duas estruturas.

É possível, até 31 de março, deixar um contributo na página da internet sinaga.pt, e este processo de auscultação tem como pontos altos os debates públicos e conferências que acontecem nos dois polos. O primeiro já aconteceu. Teve como ponto de partida uma visita guiada por Marcelo Borges, que abriu espaço para as conferências de João Amado Mendes e José Manuel Lopes Cordeiro, historiadores especializados em património industrial, e da arquitecta Inês Vieira Rodrigues.

Um regresso ao passado, para olhar o futuro

© CM LAGOA

Na manhã de 22 de fevereiro, o gigante industrial do coração da Lagoa voltou-se a encher de pessoas que visitaram o espaço e imaginaram as formas que ele pode tomar. Por uma manhã, ficou cumprida uma das intenções da Câmara da Lagoa: “devolver vida e pessoas” à fábrica.

De boas intenções estava a plateia cheia, e as da autarquia eram já conhecidas: ter um espaço de restauração, um museu alusivo ao passado da fábrica, comércio local, espaços para a indústria cultural e criativa, com oficinas e laboratórios, e um espaço de residências artísticas.

O presidente da autarquia, Frederico Furtado Sousa, quer “honrar o papel central” que a fábrica teve na vida da Lagoa e tirar o maior proveito da sua “localização privilegiada”, criando “sinergias com o tecnopolo, a norte, e abrindo aquele espaço à frente-mar, a sul, com a criação de espaços verdes”.
Das ideias da Câmara para aquele espaço de 10 mil metros quadrados, várias são partilhadas por muitos dos participantes no debate.

Comecemos pelo que parece já estar garantido.

Salvaguardar a memória é prioridade

© CM LAGOA

Qualquer intervenção terá de conservar o património que ainda existe, como as caldeiras, recuperar arquivo documental e fotográfico e contar a história. Esta é uma garantia deixada por Duarte Freitas, Secretário Regional das Finanças, Planeamento e Administração Pública, e referida por todos os outros intervenientes – do presidente da Câmara ao presidente da Secção Regional dos Açores da Ordem dos Arquitectos, passando pelos especialistas convidados e membros da comunidade ali presentes. E “já se perdeu metade do património, como tanques para guardar álcool e melaço que foram para o lixo”, alertou um morador vizinho da fábrica.

Mas a história que se conta vai além do que se produzia. “Não tem somente a fábrica, tem memória cívica. Foi aqui que a Região conheceu a primeira forma de liberdade. Aqui se comia, aqui se estudava, havia bolsas de estudo para os filhos dos trabalhadores. Havia uma companha de pesca, e, quando o mar estava mau e não dava para pescar, os pescadores tinham aqui outros trabalhos adjacentes, que permitiam levar para casa, sempre, um salário mais ou menos estável”, lembrou um lagoense, que, como tantos outros, viveu ligado àquela fábrica.

A fábrica do álcool foi motor de recuperação económica no final do século XIX, altura em que o ciclo da laranja entrava em declínio. A transformação da beterraba e da batata-doce garantiu emprego a várias gerações e gerou também um impulso indireto na produção agrícola destes recursos. É, por isso, com orgulho que da plateia uma voz se levanta para dizer que aquela fábrica tem “histórias que chegaram à Lagoa toda”.

A fábrica dos sonhos e a máquina da concretização

© CM LAGOA

Recordar é viver, mas sonhar é viver melhor. E a manhã de 22 de fevereiro serviu para fazê-lo em conjunto. Foram idealizados espaços comerciais e de restauração, um mercado municipal, uma biblioteca municipal e um pequeno hotel. Turismo industrial foi a palavra de ordem.

Saiu-se com o consenso de que é preciso respeitar o património e o legado da antiga fábrica do álcool, agora fábrica de sonhos. É preciso aliar memória e economia. Promover o potencial económico do espaço, para que ele possa ser sustentável, pô-lo ao serviço da população.

Ainda assim, dos sonhos sobram dúvidas… Quem ficará com o encargo de os tornar realidade? A quem caberá mantê-los? Quanto dinheiro há para isso e de onde é que ele vem?

Este é um projeto bicéfalo, com um polo na Lagoa, outro em Ponta Delgada. São dois espaços independentes, mas devem complementar-se. Por isso, a 22 de março abre-se mais um lugar de debate, e talvez de esclarecimentos, desta vez na fábrica do açúcar, em Ponta Delgada.

A análise dos contributos deverá ser entregue ao Governo até ao final do ano.

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