A Câmara Municipal de Lagoa já apresentou a Agenda Cultural Lagoa 2025. Esta agenda, composta por mais de 45 eventos, promove diferentes formas de arte e cultura, desde logo teatro, música, cinema, literatura, dança, artesanato e património histórico e abrange todas as freguesias do concelho de Lagoa, segundo nota enviada pela autarquia.
Segundo o presidente da câmara lagoense, Frederico Sousa, citado na mesma nota,“muitos dos eventos apresentados contam com a parceria e o apoio de várias instituições e associações lagoenses e pretendem valorizar as nossas tradições, a nossa identidade local e património, não descurando aquilo que é o gosto e a expetativa do público lagoense e em geral, em termos de eventos festivos, mantendo-se os grandes eventos e até recuperando alguns”.
Neste ano de 2025, a autarquia destaca três apostas, nomeadamente o regresso do cinema, no cineteatro lagoense Francisco D´Amaral Almeida, com sessões de cinema todos os sábados, pelas 21h00 e no primeiro domingo do mês, com uma matiné pelas 15h00, excetuando-se os meses de junho, julho e agosto, lê-se.
“Esta é uma aposta que vem do passado, e que queremos recuperar num espaço preparado para isso, já a partir do mês março, sendo que, não descurando a possibilidade de, durante o verão, se ter ciclos de cinema ao ar livre, que poderão decorrer em vários locais do concelho”, salientou o autarca.
A outra aposta assenta na dinamização do Auditório Ferreira da Silva, um equipamento público da Câmara Municipal, inaugurado a 21 de julho de 2023, na Vila de Água de Pau.
Nesse âmbito, vão decorrer, ao longo do ano, vários momentos com teatro e exposições, “numa apologia que valoriza artistas nacionais, mas também locais”, pode ler-se ainda. Já neste mês de fevereiro, acontece o concerto de Raquel Tavares, no dia 14 de fevereiro, inserido no festival “Ás vezes o amor” que acontece em 16 cidades do país; a comédia “o Teu Talk Show” com António Raminhos e Luís Filipe Borges, no dia 15 de março, e o concerto musical com o artista Noble, a dia 10 de maio, eventos estes com entrada paga, explica ainda a autarquia.
Estão também previstas outras iniciativas, gratuitas, sendo que, “no total, são dez os principais eventos que se destacam e que foram projetados para este espaço público, entre outros, não menos importantes e representativos da nossa cultura. A planificação de atividades no Auditório Ferreira da Silva é assim uma nova oferta cultural e uma aposta da Câmara Municipal de Lagoa que privilegia o desenvolvimento cultural, no seio da comunidade pauense, que esperamos que apreciem, mas ,também, visa captar pessoas fora do concelho e até de outras ilhas”, explicou o autarca, citado no mesmo comunicado.
Outra aposta do município passa por retomar a Festa Branca do Convento, que foi realizada pela última vez em agosto de 2018 e que teve um interregno devido à pandemia. Vai ser realizado nos mesmos moldes anteriores, sendo que a 9ª edição vai dinamizar o convento de Santo António, no dia 23 de agosto.
A par destas novidades, vão decorrer os habituais eventos, como as Festas de Santo António, de 9 a 14 de junho, na zona envolvente entre o polidesportivo, o convento de Santo António e a Rua do Convento. Destaca-se como componentes principais deste evento, o desfile de marchas populares, a gastronomia, os casamentos e procissão em honra de Santo Antônio e dois concertos musicais memoráveis, mais precisamente os Sons do Minho e o cabeça de cartaz, Tony Carreira, que vão atuar nos dias 9 e 10 de junho, respetivamente.
Já o Festival Lagoa Bom Porto – Festa em honra de S. Pedro Gonçalves Telmo, que se realiza de 20 a 22 de junho, vai decorrer no Passeio Marítimo da Cidade, em concreto no Portinho de S. Pedro e vai contar com momentos musicais que vão envolver a participação de artistas locais e nacionais, sendo que, no dia 20 de junho vai atuar o artista Diogo Piçarra. Carolina Deslandes vai subir ao palco no dia 21 de junho. Vai haver ainda o habitual churrasco de peixe e honras ao padroeiro dos pescadores, no dia 22 de junho, no Porto dos Carneiro.
A Câmara Municipal de Lagoa vai dar continuidade às festas em honra do Divino Espírito Santo, sendo que, de 27 a 29 de junho vai ir organizar o Império de S. Pedro, na vila de Água de Pau, com as habituais entregas de pensões pelos detentores do cartão Lagoa + Saúde; missa e coroação em honra do Divino Espírito Santo, com partilha de sopas, refere ainda a nota.
A 19ª edição do festival de Cantorias ao Desafio dos Remédios, decorre de 21 a 23 de fevereiro, organizado pela Associação Cultural dos Remédios.
A autarquia destaca também o lançamento do álbum “Memórias da Lagoa”, previsto para 11 de abril, dia de feriado municipal; a apresentação da edição da obra completa “Etnologia dos Açores” de Francisco Carreiro da Costa, no dia 4 de julho e o lançamento de uma obra dedicada à “Memória da Cultura Desportiva da Lagoa”, da autoria e investigação de Marcelo Borges, a 3 de outubro. Os três lançamentos vão ter lugar no cineteatro lagoense Francisco d´Amaral Almeida, na freguesia do Rosário.
O comunicado refere também que esta agenda não contém todas as iniciativas que se vão realizar a nível cultural no concelho, “mas comporta os principais eventos que têm sido feitos regularmente com o propósito de contribuir para o desenvolvimento cultural e para a dinâmica social, económica e turística que se pretende para a Lagoa”.
Fundado a 15 de agosto de 2006, o Grupo de Cantares Vozes do Monte Santo anima há 18 anos as festas populares e diversos eventos, não só da freguesia de Água de Pau, como de toda a Ilha de São Miguel. Artur Almeida, responsável pelo grupo, partilha com o Diário da Lagoa (DL) a história e os desafios que enfrentam atualmente.
É em 2006, “pela altura das Festas da Nossa Senhora dos Anjos”, que surge, em sua honra, o Grupo Vozes do Monte Santo. A sua criação veio do intuito de, inicialmente, dar continuidade aos “bailes” populares, que existiam, “antigamente”, durante esta época. Ao longo dos anos, o grupo foi demonstrando uma evolução, voltando-se para os “espetáculos” e “outros eventos”.
Atualmente, integra 11 membros, com idades compreendidas entre os 14 e os 58 anos. É composto por duas vozes principais, “a primeira e a segunda voz” e, para além de cantarem enquanto grupo, tocam também alguns instrumentos, incluindo o acordeão, a guitarra, o cavaquinho e o baixo.
É sempre em conjunto que planeiam o “repertório para todo o ano”, porque gostam de poder decidir “todos juntos” a estrutura dos seus espetáculos. O responsável refere que a “música popular” é o tipo de música que, normalmente, o grupo apresenta, incluindo, também, música típica açoriana.
O grupo Vozes do Monte Santo participa em diversos eventos, sendo convidado, não só para a animação de “missas de casamentos e batizados”, como para “coroações” e celebrações das “Festas do Espírito Santo”, em toda a ilha. A animação trazida pelo grupo, com as músicas que apresenta, é muito requisitada pelos amantes de música portuguesa. “Na altura do Espírito Santo, vamos a casa das pessoas, que nos convidam para ir fazer um serão”, conta Artur Almeida ao DL.
Chegaram a atuar em Santa Maria, “há alguns anos”, pela altura das “festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres”, sendo esta a “única vez” que o grupo se terá apresentado “fora de São Miguel”, acrescenta.
Durante as festividades do Natal, assim como durante a época da tradição de “cantar às estrelas”, o grupo “costuma ser convidado para atuar”, o que não terá sido possível na época natalícia mais recente, devido a alguns problemas que enfrentam.
Artur Almeida ressalva, ainda, que o grupo de cantares “faz questão” de “nunca falhar” na sua atuação durante as festas de Nossa Senhora dos Anjos, em Água de Pau.
O ano passado trouxe algumas dificuldades em termos de horário para o grupo. A falta de compatibilidade entre os horários de ensaio e os horários profissionais de alguns dos “mais importantes” membros, faz com que se torne difícil a existência de ensaios consistentes, sendo este o maior desafio que enfrenta o grupo de cantares.
Esta questão, tornou a sua participação na edição de 2024 do “Natal dos Hospitais”, realizado na Vila de Água de Pau, impossível. “Em tempos normais, costumamos reunir à segunda e sexta-feira para ensaiar na nossa sede, no Centro Comunitário de Água de Pau, cedido pela Câmara Municipal de Lagoa, mas, neste momento, o nosso futuro é incerto, porque não temos nenhum espetáculo marcado nem nada em vista”, acrescenta o responsável.
Apesar das dificuldades, o grupo mantém-se de pé e deseja um dia poder aceitar o convite de “atuar nos Estados Unidos da América”. Levar para outro continente “um grupo sem fins lucrativos de 11 elementos não é fácil, requer muito trabalho e muitas poupanças”, conclui.
O Montanha Pico Festival apresenta vários documentários na sua décima primeira edição, que arranca no primeiro fim de semana do ano, segundo nota de imprensa enviada pela organização do festival.
“O documentário está em grande produção nos Açores,” admite Terry Costa, diretor artístico da MiratecArts e fundador do Montanha Pico Festival, citado no comunicado. “Desde produções independentes a projetos apoiados pela RTP Açores, o programa do festival está aberto a todo o tipo de produção.”
No sábado, 4 de janeiro, às 20h, no Auditório da Madalena, o terceirense André Leonardo apresenta o documentário “Faz Acontecer: Uma Viagem Maior que o Mundo”.
Aos 24 anos, o açoriano partiu sozinho para uma expedição à volta do Mundo onde percorreu mais 126 mil km e passaria por quatro continentes e 23 países. O seu objetivo era simples: procurar energia e ânimo para além da «crise» e da «dívida», estabelecer contacto com pessoas positivas, deixar-se contagiar por empreendedores, tanto nos negócios como na vida, aprender com gente que vencia todo o tipo de adversidades e que, mais do que criar empresas ou promover projetos, fazia acontecer encarando o presente e o futuro com otimismo e com capacidade de sonhar, segundo a mesma nota.
“Uma história que nos demonstra que fazer acontecer está ao nosso alcance, haja dedicação e compromisso. André apresenta a sua história no grande ecrã e em conversa ao-vivo. Um evento a não perder”, lê-se.
No domingo, com as apresentações de dois trabalhos de MJ Sousa, a conversa sobre o documentário vai ser mais aprofundada. O programa arranca pelas 16h00 com “Cócegas na Terra” e “Sabrina”.
Na sessão de domingo às 21h, várias curtas experimentais vão ser apresentadas, incluindo o documentário que explora a vida de Fábio Quintiliano, um indivíduo da ilha de São Miguel, que cria vídeos no YouTube com uma identidade singular. O trabalho de Sara Massa e Martim Morais encerra a noite no Auditório da Madalena.
Na terça-feira, 7 de janeiro, e a abrir as sessões no Auditório Municipal das Lajes do Pico, o documentário de Bruno Correia “Guardiões da Esperança”, uma produção da RTP Açores, mereceu destaque em termos de obras de longa-metragem.
Todas as sessões são abertas ao público em geral e de entrada livre.
No passado sábado, dia 30 de novembro, o Centro Natália Correia, na Fajã de Baixo, recebeu o IX Encontro de Escolas de Violas de São Miguel.
O evento, produzido desde 2005 pela Associação de Juventude Viola da Terra, tem o intuito de demonstrar o trabalho que as escolas de violas da ilha vão desenvolvendo ao longo do ano letivo, incutindo, ao mesmo tempo, a partilha musical e o convívio entre as diversas escolas e realidades de ensino, segundo nota enviada pela AJ Viola da Terra.
A anfitriã foi a Escola de Violas da Fajã de Baixo, fundada em 2008 por iniciativa do presidente do Grupo Folclórico da Fajã de Baixo, António Feliciano. Atualmente, a escola conta com 15 alunos, dos 12 aos 78 anos. A Escola apresentou-se, inicialmente, com três turmas, tendo finalizado com três peças em conjunto, com 11 alunos da Escola que marcaram presença, lê-se ainda.
Seguiu-se a Classe de Conjunto de Viola da Terra do Conservatório Regional de Ponta Delgada, fundada em 2011 por iniciativa do professor Rafael Carvalho. A classe de conjunto de Viola da Terra formou-se com o objetivo de ser um complemento ao ensino da turma de instrumento e, ao mesmo tempo, para fomentar nos alunos um ensino e repertório para além do tradicional. A
A Classe de Conjunto do Conservatório apresentou-se com quatro alunos de Viola da Terra, estando a cargo do professor Ricardo Melo desde o ano letivo de 2022/2023, mas mantendo a essência da sua génese de proporcionar aos alunos desafios musicais para além do tradicional, com um repertório que começou com duas modas tradicionais e culminou com duas adaptações de repertório “clássico” para a viola da terra, explica a mesma nota.
A finalizar, participou a Escola de Violas da Ribeira Quente, fundada em 1994. Atualmente, a escola tem como formador de viola da terra José Braga, antigo aluno de Rafael Carvalho na Ribeira Quente, e tem como formador de violão César Carvalho, que aprendeu os primeiros acordes com o seu pai. A Escola de Violas da Ribeira Quente fez a sua primeira participação no Encontro de Escolas de Violas uma vez que teve a sua atividade suspensa durante alguns anos, tendo sido retomada em 2022, em colaboração com o ressurgimento do Grupo Folclórico São Paulo, apresentando-se em palco com 9 tocadores: quatro de viola da terra e cinco de violão, lê-se ainda.
O IX Encontro de Escolas de Violas foi uma produção da Associação de Juventude Viola da Terra, com o apoio da Direcção Regional da Cultura. Foi uma coprodução com a Câmara Municipal de Ponta Delgada através do Centro Natália Correia e teve o apoio logístico da Junta de Freguesia da Fajã de Baixo e Junta de Freguesia da Ribeira Quente.
A conferência internacional sobre “Diferentes Expressões do Folclore Açoriano” vai acontecer quinta-feira, 10 de outubro, às 21h00, no Auditório do Museu de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira.
Esta iniciativa pretende ser um espaço de conhecimento e partilha sobre as diferentes expressões do folclore de origem açoriana no folclore açoriano-gaúcho, do Rio Grande do Sul, no Brasil, e do folclore açoriano-carolino, no Uruguai, de acordo com comunicado do Governo regional.
A conferência vai ter como principais participantes a presidente da Casa dos Açores do Estado do Rio Grande do Sul, Viviane Peixoto Hunter, e a presidente da Casa dos Açores do Uruguai – Los Azoreños, Alicia Quintana, acompanhada pela folclorista Milenna de Léon, que dinamizam dois grupos de origem açoriana nas cidades de Gravataí e de San Carlos, respetivamente, lê-se.
Esta conferência internacional é aberta à livre participação do público em geral e destina-se especialmente a todos os componentes dos diferentes grupos folclóricos da ilha Terceira.
A abertura da sessão vai estar a cargo do diretor regional das Comunidades, José Andrade, e a moderação dos trabalhos vai ser assegurada pelo historiador terceirense Francisco Maduro-Dias, com importante ligação à cultura popular.
Das várias manifestações culturais que foram levadas para os principais destinos da emigração açoriana, o folclore é das que mais expressão continua a ter nas nossas comunidades, explica o mesmo comunicado.
Presente no quotidiano cultural das associações e entidades de raiz açoriana, o folclore “representa um meio privilegiado para a manutenção e transmissão dos valores culturais das nove ilhas do arquipélago”, lê-se ainda.
A conferência internacional sobre “Diferentes Expressões do Folclore Açoriano” é promovida pela Secretaria Regional dos Assuntos Parlamentares e Comunidades, através da Direção Regional das Comunidades.
Encontramo-nos com Ana Paula Andrade no Conservatório Regional de Ponta Delgada numa tarde de sol. Enquanto procuramos uma sala disponível para a entrevista, com corredores repletos de histórias e de música, tanto crianças como antigos alunos paravam a professora para abraçá-la e eram, assim, recebidos com um sorriso rasgado e brilho nos olhos. Ao Diário da Lagoa (DL), começa por dizer que se considera “uma pessoa realizada”. Nasceu, em 1964, em Ponta Delgada, e desde cedo que sonhava ser pianista, tendo concluído o curso geral de música no Conservatório Regional para depois voar até Lisboa para estudar no Conservatório Nacional. Após cinco anos de estudos, regressou à sua ilha para uma carreira de sucesso. Desde 1989 que é professora de piano e análise e técnicas de composição no conservatório, onde também desempenhou o cargo de presidente do conselho executivo de 2004 a 2019, sendo também responsável pelo coro infantil desde 2003.
Ao nosso jornal recorda o seu percurso, reflete sobre o ensino e alerta para a necessidade de se investir na música para sermos “cidadãos mais completos”.
DL: É por gosto que está no ensino da música?
Sou uma pessoa muito feliz, sinto-me abençoada pela vida e por tudo o que tenho conseguido ao longo dos anos. Cada vez mais sinto que é um privilégio trabalhar naquilo que gosto. Claro que há condicionantes, pois no ensino há mais regras do que quando somos um artista que vive especificamente da arte. E tem que existir essa disciplina, mas estou dentro da área da música, onde gosto de ensinar e de estar rodeada de alunos, inclusive de antigos alunos que depois voltam para fazer uma visita e que depois dizem que nós professores fomos importantes para eles. Tudo isto faz com que seja uma vida muito cheia, repleta e rica.
DL: Na casa da sua avó havia um piano. A presença do instrumento influenciou-a?
Vivíamos com a minha avó e o piano estava lá, penso que foi decisivo. Na família não tínhamos profissionais da música, mas a música estava sempre presente. Antes de entrar para o conservatório fazia experiências no piano. A minha mãe perguntava-me sempre se eu queria ir para o conservatório e eu dizia que não, apesar de gostar e ir a concertos e das tais experiências, mas só aos nove anos é que ingressei no conservatório. Também pelo que me contou a minha professora de iniciação musical e de piano na altura, a dona Natália Silva — que foi uma das pessoas mais importantes na minha vida —, eu dizia sempre que queria ser pianista.
DL: Conseguia conciliar o ensino regular com o ensino artístico?
Sim. Na altura, entre 1970 e 80, existiam menos professores e alunos, a questão é que hoje em dia os alunos têm muitas mais atividades e ficam muito dispersos. Na minha geração não, pois quase não víamos televisão, nem havia jogos de computador, o que nos permitia ficar mais focados. Atualmente é mais difícil captá-los, sendo que há exceções e de uma maneira geral acredito que estejam aqui por gosto mas sinto que a aprendizagem do instrumento exige uma experiência, dedicação e organização extrema e os alunos hoje em dia estão muito dispersos por inúmeras atividades.
DL: Depois decidiu ir para Lisboa. Deixar a família, a realidade de uma ilha, para ir estudar e viver na capital foi um choque?
Foi um choque muito grande, não era como hoje em dia em que há internet. Lembro-me de chegar na varanda do lar e desatar a chorar. Mas tive a felicidade de encontrar uma colega daqui que já estava a estudar no conservatório nacional e que me acolheu. Depois fomos viver juntas noutra casa e aí iniciei uma vida nova. Fui abençoada porque os meus pais nunca me colocaram qualquer entrave, pois aceitaram a decisão e fui também muito apoiada pela minha professora Natália Silva. Era para ficar três anos em Lisboa e acabei por ficar cinco. Durante esse tempo tive igualmente a oportunidade de trabalhar para me sustentar e fiz dois cursos, tendo concluído em 1988.
Recordo-me que o que mais custou foi voltar para Lisboa depois do primeiro Natal. Liguei para a minha professora de piano, porque queria voltar para São Miguel e ela disse-me: “nem pensar, a tua vida é aí”. Dou graças a Deus por isso, pois os professores do ensino artístico são muito mais do que professores, são família.
«(…) quando vemos estes resultados
ANA PAULA ANDRADE
sentimos que é possível
(…) é preciso ter talento, trabalhar muito,
ter espírito de entrega,
acreditar que se é capaz.
Se é esse o desejo, nunca desistam,
é preciso é crer.»
DL: Ao chegar ao conservatório regional verificamos que está cheio de alunos. Há um aumento de inscrições no ensino artístico. Como encara este facto?
Fico muito feliz. Aliás, sempre defendi que o ensino artístico e a cultura estão ligados. Tem que ser obrigatoriamente parte integrante da vida de um cidadão o mais cedo possível. Nem todos podem integrar o ensino especializado, nem conseguimos receber toda a gente, mas no ensino regular sempre foi obrigatório a partir do segundo ciclo, o que é muito tarde. Todos os alunos deviam ter, desde o pré-escolar, um professor do ensino artístico específico da área. Para mim é um triângulo entre educação, cultura e ensino artístico. Tudo isto é que faz com que as pessoas possam tornar-se cidadãos mais completos. Pelo que me apercebi, o aumento pode levar a que se abranja o ensino artístico no primeiro ciclo, o que é excelente, pois revela a sensibilidade e o reflexo de que mudança passa exatamente por essa formação. Temos cerca de 500 alunos no conservatório, mas não podemos pensar que todos vão ser músicos. Se 50 forem músicos profissionais, temos 450 que vão ser um público culto e mais sensível.
DL: Tem um projeto junto de uma escola. Pode contar-nos mais sobre a iniciativa?
Nos últimos anos, temos apostado muito em projetos em parceria com escolas do ensino regular para sensibilizar as crianças.
Eu tenho o projeto “Cantando é que a gente se entende” há cinco anos na Escola dos Milagres, na freguesia da Covoada, porque sempre gostei de alargar a música para fora de portas. É uma escola pequena, consigo numa manhã abranger todos os alunos. Não queria deixar ninguém de fora e tenho crianças desde o pré-escolar até ao quarto ano. É tão gratificante chegar lá e questionarem-me: “professora, vamos ter música hoje?” É a alegria deles ao perceberem que a música faz parte da formação e da escola, é isso que tenho pena que não exista em todas as escolas.
DL: Tocou em concertos no Coliseu Micaelense, no Canadá e nos Estados Unidos da América, entre outros. São boas recordações?
Muito boas recordações. Podia ter optado por ficar no continente, mas quando cheguei a Lisboa já pensava em regressar à minha terra. Sempre gostei do conservatório regional, é a minha segunda casa e família, por isso quis sempre continuar o projeto das minhas professoras. Quando cheguei cá havia falta de professores, por isso fiquei logo empregada. E, depois, ir tocar a Toronto várias vezes ou tocar como solista com a orquestra na Universidade de Massachusetts são oportunidades que se calhar no continente não conseguia. Aconteceu através das nossas comunidades e pelo facto de ter voltado para os Açores.
DL: É a professora que é hoje devido aos professores que a marcaram?
Sem dúvida. Nós procuramos o exemplo dos nossos professores e só tive bons exemplos. Quando tenho alguma situação mais delicada penso no que elas fariam se estivessem no meu lugar. Sou hoje em dia aquilo que sou graças aos meus professores. Em Lisboa também tive professores que me marcaram: o professor Christopher Bochmann, a Melina Rebelo e o compositor Joly Braga Santos. Inclusive fiquei mais um ano em Lisboa para trabalhar com ele — comemora-se este ano os 100 anos do seu nascimento. Foi tão marcante para mim esse último ano em que acabei por ficar quase como aluna privada dele. Aprendi imenso. Foi um compositor com um percurso fantástico que tem que ser divulgado. Os nossos professores são uma dádiva, temos um bocadinho esse dever de prolongar o que nos transmitiram.
DL: Considera que investir no ensino da música torna os açorianos mais felizes?
Sem dúvida. Eu costumo dizer que a música é boa em qualquer momento, até nos tristes podemos encontrar conforto. Obviamente que uma pintora dirá a mesma coisa e eu acredito que sim, pois todas as áreas artísticas são importantíssimas. Mas acho que é mais fácil chegar a todas as pessoas, mais rapidamente, através da música. E já se tem investido muito na cultura, mas há sempre muito mais a fazer. A minha preocupação é que haja oportunidade para todos desde pequeninos. Temos aqui cerca de 500 alunos, temos projetos que abrangem mais escolas ainda, há as filarmónicas que são excelentes escolas de música, mas custa-me ainda que exista alguns sítios onde a música não chega. Há muitos talentos escondidos e às vezes vemos crianças com muito talento e os pais não têm sensibilidade para perceber que devem ajudar, ou seja, tem que partir também do apoio dos pais, os professores não podem fazer isso sozinhos. Tentamos sensibilizar, mas alguns pais não sentem que é importante. Se houver um investimento total no ensino artístico desde cedo, cobrindo toda a gente sem exceção, muitos mais talentos vão aparecer.
DL: Para concluir. É possível um jovem açoriano sonhar com uma carreira artística?
Sim, cada vez mais. Nós temos muitos antigos alunos espalhados pelo mundo e alguns em lugares de destaque. Estamos num meio tão pequeno mas quando vemos estes resultados sentimos que é possível e que tivemos a capacidade de lhes dar as asas para voarem. Obviamente que depende da aspiração de cada um, é preciso ter talento, trabalhar muito, ter espírito de entrega, acreditar que se é capaz. Se é esse o desejo, nunca desistam, é preciso é crer.
Maria João Ruivo
Professora e escritora
Por que razão se comemora Camões e a sua obra tantos séculos depois, numa época de tanto desinteresse pela leitura, de tanto desencanto e falta de entusiasmo, ainda para mais tratando-se de um poeta de leitura difícil e exigente?
Não é fácil encontrar resposta para isto. Sem dúvida, um dos segredos dos grandes artistas é a sua intemporalidade, mas não se trata apenas do que se diz. É o modo como se diz que enforma a Arte. Camões, enquanto poeta, reúne em si tudo isto, pois retrata a alma humana, o sentir dos Homens e as suas angústias e reflexões, numa linguagem única que de algum modo se ergue na sua superioridade, fazendo-nos sentir uma enorme admiração.
Camões é um verdadeiro Humanista, homem de múltiplos saberes, que representa bem o espírito do Renascimento, movimento de viragem que trouxe uma série de transformações que influenciaram profundamente a forma como o homem europeu passou a encarar o universo, fruto, em parte, do acesso a novos mundos, realidades e culturas. Essa época apresenta-se como uma importante experiência, que traz à luz novas mundividências e o reconhecimento do Homem como centro do Universo, por oposição ao Teocentrismo medieval, ao mesmo tempo que traz desacertos e desequilíbrios, como é próprio da mudança.
Na sua obra, Camões, como muitos outros poetas e prosadores da época, aborda não poucas vezes este tema, associando-o Ao Desconcerto do Mundo, e mostrando que Tem o tempo sua ordem já sabida;/ O mundo não, mas anda tão confuso,/ Que parece que dele Deus se esquece.*1 Estes versos podiam ter sido escritos hoje.
Na sua conhecida Esparsa (ao desconcerto do mundo), o Poeta apresenta uma reflexão bastante incisiva sobre a inversão dos valores fundamentais, já que, diz ele, os maus são premiados e nadam num “mar de contentamentos” e os bons são punidos, sofrendo “graves tormentos”. Ao refletirmos sobre este nosso mundo, não podemos negar que isto é de uma atualidade indiscutível e coloca a olho nu a injustiça e a desarmonia a que os homens estão sujeitos, sabendo nós que o mundo está longe de ser o que devia, pois nele imperam a corrupção e a falta de escrúpulos, o que gera inúmeras assimetrias e consequentes revoltas, sendo grande a nossa impotência perante aquilo a que assistimos. Aqui recordamos, desse breve poema, que o eu lírico, depois de ter decidido ser mau, buscando ser recompensado, confronta-se com um inesperado castigo, concluindo, ironicamente: (…) Assim que, só pera mim,/Anda o Mundo concertado. Calharia bem, aqui, recordar o soneto “Cá, nesta Babilónia, donde mana”, sendo que a Babilónia representa o mal presente, o caos, a existência terrena – onde o mal se afina, e o bem se dana,/e pode mais que a honra a tirania.- e Sião o passado, o Paraíso, na terminologia cristã, o bem por que todos suspiramos.
No seu bem conhecido soneto “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, Camões aborda o tema da mudança constante e inevitável, mostrando que tudo se altera, até mesmo a confiança, já que as novidades contrariam as esperanças. Numa atitude melancólica, ele expressa o seu desencanto, recordando as mágoas e questionando se teve algum bem na vida.
Expressa, ainda, a ideia de que na Natureza, a mudança tem um caráter positivo, cíclico, de renovação, mas que nele próprio surge sempre para pior, como nos revela o verso: E em mim, converte em choro o doce canto. Esta constatação conduz o poeta a uma atitude de ceticismo, porque sabe que não pode alterar a ordem das coisas, sentindo, então, o desencanto e a angústia.
Este tema, aqui brevemente aflorado, deveria ser, para nós, assunto de reflexão, já que o mundo está numa drástica mudança, de tal modo, que os homens se sentem perdidos, porque o que era válido ontem parece que hoje o deixou de o ser e isso conduzirá rapidamente a um abismo de que não será fácil sairmos.
Muito fica por dizer sobre um assunto tão vasto como este. A Mudança tornou-se tema privilegiado de muitos escritores que, atentos ao mundo que os rodeava, aproveitaram para denunciar os podres, os desacertos, a corrupção dos homens e a forma como as mudanças afetam tudo aquilo que antes era tido como garantia, ao mesmo tempo que a reconhecem como fator fundamental de progresso e de evolução intelectual. Todo o mundo composto de mudanças, e estas atingem inexoravelmente todos os seres, acabando por ser irreversíveis no Homem, revelando a fragilidade e a vulnerabilidade desse bicho da terra tão pequeno. *2
Quando leio Camões, confirmo sempre a sua universalidade e intemporalidade, já que aquilo que ele escreveu é tão válido hoje como o foi na sua época. E estas são, sem dúvida, marcas fundamentais de um grande artista, pois resultam da sua capacidade de reflexão, da argúcia com que observou o mundo e o seu tempo, de forma a aperceber-se daquilo que define o Homem na sua essência.
No fundo, em Camões, a alegria rapidamente se transforma em mágoa, quando confrontada com o mal presente, mas este sentir do Poeta facilmente se universaliza comprovando a ideia de que, para todos nós, o bem é passageiro e o mal depressa lhe toma o lugar:
Um gosto que hoje se alcança
amanhã já o não vejo;
assim nos traz a mudança,
de esperança em esperança,
e de desejo em desejo. *3
*1 Soneto “Correm turvas as águas deste rio”
*2 Os Lusiadas – Canto I – Estãncia 106
*3 Canção “Sôbolos rios que vão”
O júri do Prémio Literário Natália Correia 2024 – Ficção decidiu atribuir o prémio à obra “Caindo de mais alto”, da autoria de João Albano Fernandes, e entregar uma Menção Honrosa a “Esperanças e Desilusões”, de Luís Corredoura, segundo nota de imprensa enviada pela Câmara Municipal de Ponta Delgada.
O coletivo de jurados assinala, deste modo, “a excelência da ficção literária evidenciada por ambas as obras, distinguindo-as por entre as 73 que foram admitidas e analisadas nesta quarta edição do concurso”, lê-se.
Entre outras considerações elogiosas sobre “Caindo de mais alto”, o júri destacou a “escrita inaugural e poética” patente na obra, salientando constituir-se como uma “lição de literatura” que “honra o prestigiante Prémio Literário Natália Correia 2024 – Ficção”.
“Ao longo de 136 páginas, a leitura fica cativa de uma voz com inequívoca maturidade literária, que nos prende ao espanto da beleza erguida sobre uma vida em ruínas. E, quando pensamos que nada mais nos poderá surpreender nesta narrativa, o modo como ela termina, não só nos faz acreditar na redenção, como nos mostra, em poucas palavras, de que são feitos os grandes textos literários”, enalteceu ainda o júri.
A obra vencedora vai ser editada pela Câmara Municipal de Ponta Delgada e o vencedor vai receber um prémio no valor de 7.500 euros, explica o comunicado.
A cerimónia de entrega do prémio e da menção honrosa está agendada para o dia 10 de outubro, no Salão Nobre dos Paços do Concelho.
O Prémio Literário Natália Correia tem como como objetivo incentivar e apoiar o desenvolvimento das artes literárias, fomentando a criatividade, o gosto pela leitura e pela escrita. Foi criado em 2021 para distinguir autores com obras originais e inéditas redigidas em Língua Portuguesa.
O Centro Cultural da Caloura vai inaugurar, no dia 14 de setembro, a exposição individual intitulada “A Costela de Eva”, da autoria de Luís Miguel Cordeiro, pelas 17h00, segundo nota enviada pela Câmara Municipal da Lagoa.
Trata-se da primeira exposição do artista e vai contar com alguns dos trabalhos que tem vindo a desenvolver ao longo dos últimos anos. “A criação desenvolve-se a partir de uma urgência de criar e celebra exatamente a criatividade espontânea, o uso de materiais incomuns e com a figura feminina quase como agente dessa libertação, nem sempre de forma figurativa, talvez até fragmentada ou completamente abstrata. Algumas obras transportam-nos ao universo da arte pop, com cores expressivas e com muita saturação”, lê-se no comunicado.
A mostra vai ficar patente até ao dia 9 de novembro, com horário de abertura ao público, de segunda a sábado, das 10h30 às 12h30 e das 13h30 às 17h30.
A exposição conta com a co-curadoria de Paula Mota e integra o programa “Open Studios” do evento Walk&Talk, que decorre todos os anos no Arquipélago dos Açores.
Luís Miguel Cordeiro nasceu em 1980, em Ponta Delgada, onde reside atualmente. Licenciado em Fisioterapia, pela Faculdade do Porto, e em Medicina Tradicional Chinesa, em Lisboa. Frequentou aulas de pintura com Paula Mota e Gregory Le Lay, em Ponta Delgada, alguns workshops formativos tais como “Quimigrama”, na Sociedade Nacional de Belas-Artes, e ateliers de pintura criativa. Desde 2003, tem produzido de forma livre e experimental, trabalhos com recurso a materiais diversos. Esta é a sua primeira exposição e inclui obras do período compreendido entre esse ano e a atualidade.
O XXX Festival de Folclore do Grupo Folclórico Ilha Verde é destaque no programa das Noites de Verão desta semana, na cidade de Ponta Delgada, em São Miguel, anunciou esta terça-feira, 23 de julho, a autarquia.
Na sexta-feira, 26 de julho, pelas 21h00 na Praça do Município, acontecem as apresentações onde o público vai poder apreciar a dança, a música e os trajes típicos.
O festival, organizado pelo Grupo Folclórico Ilha Verde, conta nesta edição com a participação do Grupo Folclórico de São Pedro da Lomba do Cavaleiro, da Povoação, o Grupo Folclórico de São José da Salga, do Nordeste, o Grupo Folclórico de Nossa Senhora da Graça do Porto Formoso, da Ribeira Grande e vindo do continente português, mais especificamente do Porto, o Rancho Folclórico Santa Eulália de Constante de Marco de Canaveses.
Quanto ao restante programa destas Noites de Verão no centro histórico da cidade, na quinta-feira, 25 de julho, pelas 21h00, haverá animação itinerante da Associação Tradições, denominada “Mãe Natureza”.
No sábado, 27 de julho, para além dos habituais pula-pulas no lado sul da igreja da Matriz, pelas 21h00, vai decorrer em simultâneo o concerto Halakandá de Aníbal Raposo, na Praça do Município, e no domingo é a vez da Filarmónica Nossa Senhora da Oliveira, da Fajã de Cima, subir a este mesmo palco, pela mesma hora.