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Fim das touradas!

Maria Chaves Martins
Licenciada em Direito

Há, sensivelmente, 200 anos que a abolição das atividades tauromáquicas está na agenda política. Ao longo desse período, diversas iniciativas legislativas foram discutidas no parlamento com o intuito de colocar fim à atividade, devido à violência perpetrada contra os animais.

Essas iniciativas esbarraram em argumentos vazios de coragem política e de fundamento, havendo uma tendência para a proliferação de mitos sobre a justificação da importância da atividade tauromáquica: tradição; cultura; popular; extinção da raça; a atividade é responsável por uma percentagem significativa do PIB; etc. Balelas, perdoem-me.

Alguns atores políticos teimam em não ver o óbvio: as veementes manifestações da sociedade civil contra as atividades tauromáquicas – paradoxo dos progressos civilizacionais em matéria de bem-estar animal.

Há um movimento mundial abolicionista. A sociedade agrupou-se em diversos movimentos que têm instado a justiça a proferir decisões que impedem a prática de atividades tauromáquicas. Veja-se o exemplo da Cidade do México, em que a maior praça de touros do mundo – Monumental Praça de Touros, está interdita, e a maioria da população manifesta-se contra a tauromaquia.

Portugal é visado nesse movimento por integrar o grupo dos 7 países que, ainda, praticam este tipo de tortura, estando cada vez mais isolados.

Diversos municípios indeferem pedidos de licenciamento das atividades tauromáquicas e estão a converter os espaços de tortura em espaços multiusos para a comunidade. Dezenas de cidades na Região Norte de Portugal renunciaram às touradas na última década – recentemente, Viana do Castelo e Póvoa do Varzim.

É esse o rumo que espero que o concelho da Lagoa tome, repudiando as atividades tauromáquicas, assumindo-se como um concelho “smart”, e impedindo a proliferação de uma atividade sem memória no concelho, com preceitos anacrónicos que desvirtuam a ideologia de «Smart City». 

Marcas como a GALP, Sagres, Pingo Doce e Vodafone têm-se distanciado do apoio às atividades tauromáquicas. A RTP suspendeu a transmissão de touradas durante o ano de 2021.

O Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas tem reservas quanto ao bem-estar físico e psicológico das crianças envolvidas na tauromaquia, recomendando a proibição do envolvimento dessas, sugerindo a adoção de medidas de sensibilização para a violência da tauromaquia e o seu impacto nas crianças.

A Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco e a Amnistia Internacional reconheceram que a tauromaquia pode colocar em perigo crianças e jovens, bem como o seu desenvolvimento, provocando um efeito de dessensibilização à violência, violando a Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

O quadro legal vigente, que consagra os animais como seres sencientes, criou uma exceção para a tauromaquia devido à violência que pratica, sob pena de ser complemente ilegal. Isto é especismo, norteado por um fim utilitarista.

Aplaudimos ou apupamos um espetáculo de tortura? Cabe-nos decidir e demonstrar aos atores políticos que abominamos atos de violência, especialmente, aqueles que são praticados contra os mais vulneráveis, como os animais.

O combate à cultura da violência é diário, não podemos normalizar a violência, independentemente do seu tipo, forma e gravidade.

Citando Fado Bicha em Estourada: “Queremos o touro respeitado / Nem toureiro nem forcado / Pegado, atado, largado, garraiado / Não é gado / É um animal assustado.”

Fim à cultura da tortura, fim às touradas!

Artigo de opinião publicado na edição impressa de setembro de 2022

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