Fábrica do Álcool, quo vadis?

Licenciada em Direito
Para onde vais, Senhor? Confesso, aderi à moda e adotei a expressão latina em voga empregue para questionar políticas públicas regionais. Mas é, efetivamente, isto a que me proponho, abordar um tema muito caro à Lagoa: o destino da Fábrica do Álcool.
Há pouco mais de um ano foi aprovada a extinção da SINAGA, tendo sido o seu património transferido para a alçada da Região.
Uns meses depois da extinção e perante os boatos da intenção do Governo Regional delapidar esse património, a Assembleia Regional aprovou uma iniciativa do PAN/Açores cujo intuito primordial é a proteção do património da SINAGA, do qual faz parte a Fábrica do Álcool.
Com essa decisão, a classificação da Fábrica do Álcool, como de interesse municipal, é reforçada.
A par disso, a voz da sociedade civil foi ouvida e a Assembleia Regional imputava ao Governo Regional o dever público de adotar medidas efetivas que protegessem e valorizassem esse património.
Entretanto, o Governo Regional anunciou que pretende arrendar os reservatórios da fábrica, mas só isso.
Acresce que esse mesmo Governo autorizou, em Abril passado, a utilização gratuita pela Câmara Municipal de Vila Franca do Campo da Casa da Balança, também património da extinta SINAGA e agora sob o domínio da Região. Então e a Fábrica do Álcool?
A gestão do património da Fábrica do Álcool deve acontecer numa perspetiva inovadora e dinâmica, sobretudo na sua preservação e reconversão, inserida num processo coerente com a matriz identitária da população e com o local onde está inserido, com o desígnio essencial de acrescentar valor útil para a população.
Tal só se afigura exequível através de uma efetiva participação pública da comunidade, promovendo-se o seu envolvimento no processo decisório da definição das diretrizes do novo ciclo. Sem prejuízo de ser realizado um concurso de ideias.
Em paralelo, é urgente a realização de obras de conservação no imóvel, especialmente na chaminé da fábrica, devido ao seu estado de degradação, representando um risco real para a segurança de pessoas, animais e bens. E esse dever de execução de obras recaí, em primeira linha, sobre o proprietário: a Região.
A esse dever acrescem os seguintes que resultam da iniciativa aprovada pela Assembleia Regional: o dever de proceder à inventariação e levantamento do estado de conservação do espólio que compõe o acervo da Fábrica do Álcool; a adoção de medidas urgentes para reabilitação e preservação da edificação; e a classificação da Fábrica do Álcool como de interesse público regional.
Todavia, atenta a inoperância do Governo no cumprimento dos deveres, porque não entrega a gestão do património da Fábrica do Álcool à Câmara Municipal da Lagoa em moldes análogos ao sucedido com a Casa da Balança?
É sabido que a Câmara Municipal não tem disponibilidade orçamental para adquirir o imóvel, mas julgo ter competência e vontade para, engenhosamente, evitar a progressiva degradação e delapidação a que aquela está sujeita.
Certamente haverá algures um programa comunitário com verba disponível para executar uma ideia inovadora que permita uma adequada reconversão da Fábrica do Álcool, honrando o seu legado. Ou até o PRR…
A Fábrica do Álcool representa a memória de um lugar e de um concelho, sendo merecedora de um destino que dignifique o seu legado, não se podendo consentir o seu abandono.
Artigo de opinião publicado na edição impressa de maio de 2023