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Novo Presépio da Lagoa na Portugalia em Fall River, e outro Açor-Americano na Biblioteca Casa da Saudade em New Bedford

Os anos passam, mas a novidade-vontade de realizar presépios para mim continua, sim, porque em cada Natal tudo se repete e nada é, nem vai ser igual

Presépio da Lagoa na Portugalia Marketplace, em Fall River  © D.R.

Regresso aos Estados Unidos para realizar dois grandes presépios a convite da Portugalia Marketplace. Neste natal de 2024 inaugurará na sua loja em Fall River, no dia 6 de dezembro, pelas 6.00pm, um presépio de tradição lagoense em movimento inovador com nuances diferentes dos anteriores.

Porque a Portugalia Marketplace e toda a família do empresário Fernando Benevides, passada uma década a permitir-me promover e a realizar Presépios da Lagoa para os seus clientes luso e americanos, vai expandir a sua iniciativa e promoverá outro em New Bedford, na Biblioteca da Casa da Saudade. Este segundo presépio, terá também o apoio da Magazine “A Praça” porque Filomena Branco, uma das suas colaboradoras, ofereceu-me, a pedido do seu editor, David Loureiro, uma coletânea de figuras e casas dum magnífico presépio americano.

Assim, no dia 5 de dezembro pelas 5.00pm, a Biblioteca Casa da Saudade abrirá as suas portas ao público para a abertura da exposição de um inédito presépio açor-americano, pois integrará as duas tradições com figuras natalícias dos bonecreiros de Lagoa nos Açores juntamente com figuras e elementos urbanísticos americanos.

Na abertura de ambas as exposições contaremos com a presença do Mayor das respetivas cidades, representantes da Casa dos Açores da Nova Inglaterra, Escolas Portuguesas, Maria Tomasia e o grupo de Idosos da Casa da Saudade, assim como convidados, lagoenses, público da biblioteca e clientes da Portugalia Marketplace, o “ponto de encontro” da comunidade luso e americana.

Presépio na Casa da Saudade elaborado com livros © D.R.

Era uma vez…

O presépio tipicamente açoriano, aquela representação associada com a minha infância e em cuja feitura participei, em criança, com os meus irmãos e familiares, distinguia-se pela extraordinária variedade e curioso aspeto dos mais diversos objetos e primazia em construir o presépio no melhor quarto da casa. Os figurantes, na sua maioria eram simples bonecos de barro. Figuras de feição popular, com mulheres de capote e capelo, e outras de xaile e lenço. Lavadeiras, umas ajoelhadas no jeito de esfregar roupa na pedra, e outras de pé com trouxa na cabeça. Há os artefactos de vimes nas canastras seguras à cabeça de mulheres, dos cestos de trabalho dependurados ao braço dos homens, dos cestinhos de asa na mão das velhinhas, e ainda os seirões de burro mais as sebes das carroças. A olaria tradicional aparece representada em jarras, talhas e infusas, de barro vermelho, as quais são acarretadas à cabeça, ao ombro, ou no braço (com o apoio do quadril), por figuras em trajes regionais. Há igualmente figuras de militares trajando antigas fardas, padres de batina e sobrepeliz, barbeiros e sapateiros, tocadores de viola, rabeca e realejo, namorados e bailarinos, pescadores a pescar sentados sobre pedras e até matadores de porcos, em pleno desempenho do seu ofício.

Uma particularidade que, apesar da longa distância dos anos, nunca se esvaiu da minha memória, é essa de ter ajudado a fazer casas de papelão, com portas e janelas, algumas delas com o seu quintal. Com serradura alinhavam-se ruas e passeios. Moinhos de vento encimavam pequenos montes. Em lagos improvisados (por vezes um alguidar de barro, ou um pedaço de vidro cercado de musgo), flutuavam barquinhos e nadavam patinhos e peixinhos. Tudo isso, e muito mais, ficou estancado no tempo e espaço.

Confesso, sinceramente, que o presépio da minha infância constituiu sempre uma autêntica e enternecedora parada de cenas populares, que ainda hoje recordo com emoção, saudade e me motivam a continuar a fazê-los e a coleciona-los.

Bonecreiro do Rosário, António Morais, autor do presépio e a sua esposa Lurdes © D.R.

Desde que me lembro, desde tenra idade, que gosto de presépios e por isso ansiava pelo dia 25 de dezembro para ir com a minha família, visitar a minha madrinha Maria do Carmo e os primos Vieira na Praça Velha e assim poder ver o presépio deles. Cumpria-se o ritual. Eu é que tocava a campainha estridente da porta, que quando arranhava, o som afugentava ou assustava os mais distraídos, que se cruzavam connosco, no número oito da rua dos Coelhos. Ainda a família se cumprimentava e já eu escapulia para ir ver o presépio dos primos. O primo Quintiliano me fascinava. Era muito habilidoso. Fabricava o seu próprio fogo de artifício para as nossas festas de Natal e passagem de ano, e com a ajuda do filho António Inácio construía todo o presépio. Uma maravilha, autêntica réplica do cenário mais conhecido de Água de Pau, como o Monte Santo e a rua do Pico, a Igreja, o Fontanário e a Praça Nova, o comércio e a agricultura, as pescas e as festas e muitas das cenas do quotidiano rural de outros tempos. Não esquecendo a gruta e as figuras sagradas do presépio, bem entendido. Se olhava respeitoso, essa cena, era já com outros olhos que partia à descoberta dos lugares, dos cenários e das cenas mais diversas que constituíam o presépio deles. A árvore de Natal, as pedras de vermelho negro, dos vulcões, os musgos, as verduras e a serradura dão-me então saudades incríveis de tempos idos. De quando ia buscá-los, com o nosso trabalhador das terras, Tio Zé Raposo Tramela e os meus amigos João e Antero e o primo Victorino, ao Matinho e ao Monte Santo. A serradura ou farelo, para os caminhos, vinha da serragem e da oficina do mestre Antero Amaral. Era um leilão lá em casa, e, de vez em quando, enquanto o presépio não estava pronto, lá íamos atrás do Antero. Saltávamos o muro, que separava a nossa casa da dele, e de corrida, sentávamo-nos no capacho de linho-de-russo da cozinha da senhora Leonilde. Lá vinha a Alice com os bolinhos de Natal que a senhora, sua mãe, tirava do forno para nós. Era uma luxúria. Belo tempo!… pois era…

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