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“A fé é mais do que um acreditar, Deus não é uma teoria”

Santa Cruz, na Lagoa, foi o palco escolhido para o primeiro Encontro de Jovens Shalom nos Açores. O Diário da Lagoa quis perceber o que leva jovens oriundos de diversos pontos de Portugal a unirem-se numa comunidade espiritual e o que os move a visitar a maior ilha açoriana

Jovens ficaram alojados na freguesia de Santa Cruz, na Lagoa, durante uma semana © CORTESIA MEJSh

“Os jovens, através das suas paróquias, inserem-se nos grupos e caminham connosco. Acontece uma vez por ano, no mês de agosto, quando estão de férias, mais livres. Acaba, também, por ser uma ocupação e os jovens ficam muito entusiasmados”, começa por contar ao Diário da Lagoa (DL) Henrique Teodoro, 21 anos, natural da freguesia de Nossa Senhora do Rosário, na Lagoa.

Henrique recebe o DL numa manhã de verão, no interior do convento de Santo António, em Santa Cruz, para apresentar o Movimento de Encontros de Jovens Shalom (MEJSh) que decorreu pela primeira vez no arquipélago dos Açores, no passado mês de agosto, de 21 a 27, na Lagoa. O jovem lagoense ficou responsável por monitorizar todas as atividades e gerir o plenário do encontro de jovens.

Movimento foi fundado em Angola por padre natural da ilha Terceira

Numa notícia publicada em 2014, o Diário da Lagoa anunciava a chegada à ilha de São Miguel do assistente Espiritual Nacional do Movimento, o padre Vítor Lopes, e a coordenadora do Movimento nos Açores na altura, Mara Rocha [atualmente é Tiago Sousa], com o intuito de conhecer melhor a realidade pastoral local e dar a conhecer o MEJSh. Já naquele ano semeavam-se as primeiras sementes que iriam fazer germinar o encontro de 2022.

O MEJSh foi fundado em Angola pelo padre, natural da ilha Terceira, Luís Carlos, na década de 60. O reconhecimento do grupo como sociedade de vida apostólica viria a acontecer mais tarde com a criação da comunidade Shalom. Primeiro em África, depois no Brasil e Portugal, sendo que atualmente as comunidades Shalom existem em vários países do continente europeu. Em Portugal, é só no ano de 1991 que surge.

“O Shalom está em constante adaptação”

Henrique Teodoro (ao meio) ficou responsável por monitorizar as atividades e gerir o plenário © CLIFE BOTELHO/ DL

Ainda à conversa com Henrique, numa das salas do antigo convento dos frades, o jovem conta que “há muitos jovens aqui de Vila Verde, Braga, de Lisboa, Coimbra, de diversos pontos de Portugal continental” e avança que “com equipas e tudo, somos uma realidade de cerca 70 pessoas envolvidas”, sendo que os jovens ficaram alojados na EB1/JI D. Manuel Medeiros Guerreiro, a escola ao lado do convento.

Com entusiasmo, Henrique diz que “o grande impulsionador do encontro é mesmo esse, é um mistério, ao não saber o que é que vai acontecer”, revela sem esconder o sentimento que move os jovens.

Questionado se o encontro se delimita ao interior do espaço, Henrique, certificando-se que ninguém estava à escuta, confidencia que “amanhã vamos ter uma saída muito interessante. Partimos aqui do convento logo de manhã, vamos para a lagoa das Furnas e será realizada uma eucaristia de caminhada, é como se fosse uma caminhada orante e a eucaristia decorrerá ao longo do trilho em volta da lagoa. Vão também visitar o parque Terra Nostra, vão provar os típicos bolos lêvedos, as queijadas da vila, tudo aquilo a que têm direito. Vamos às Sete Cidades também.”

Depois de falar com Henrique Teodoro, o Diário da Lagoa teve a oportunidade de observar algumas atividades e, apesar de ser um retiro espiritual, verificamos a presença das novas tecnologias, entre computadores e telemóveis.

Henrique explica que “existem muitos retiros espirituais de outros movimentos e de outras instituições que restringem o uso do telemóvel, eu, pessoalmente, apoio o uso das tecnologias. Por exemplo, temos um trabalho em que é preciso ler o capítulo de um documento, estamos a falar de repente de cinco páginas, são cinco folhas por participante, já aí dá um gasto de papel enorme. Também temos outro tipo de utilização de tecnologias como QRCode e tudo o mais que temos utilizado. O Shalom está em constante adaptação.” 

De Minas Gerais no Brasil a Santa Cruz na Lagoa: “olhar de esperança”

Padre Jorge Benfica é o coordenador da comunidade Shalom em Portugal © CLIFE BOTELHO/ DL

O padre Jorge Benfica, coordenador da comunidade em Portugal, veio de Lisboa com os jovens e foi-nos apresentado por Henrique. Jorge começa por nos dizer que é natural da cidade de Nova Lima, no estado de Minas Gerais, no Brasil, e que já esteve várias vezes no arquipélago açoriano.

Ao DL, revela que “agora lembro com muito carinho e saudade do Dom António. Foi a pedido dele que chegamos aqui”.

Jorge Benfica diz-se satisfeito e que se trata da “realização de um sonho” porque “ao longo desses anos, fui acompanhando de mais perto o trabalho com os jovens aqui, especificamente aqui em Santa Cruz, e também noutras paróquias, mas aqui mesmo criaram-se raízes”, diz.

Percebendo o crescimento dos jovens e o seu interesse, “o querer fazer um caminho bom, tanto de crescimento humano como espiritual”, o padre conta que acabaram por conseguir envolver outros jovens “nessa roda de crescimento”.

E, prossegue: “no continente a gente sabe da dificuldade em termos de deslocação. Para ir para fora e passar uma semana que seja num trabalho desse nível custa um pouco. Por causa dessa riqueza, desse entusiasmo é que era um sonho realizar um grande encontro aqui”.

Quanto a uma suposta crise espiritual entre os jovens, Jorge diz que “embora haja um movimento contrário, o não querer saber de uma vivência da fé, o querer viver tudo para agora, a fé dá noção do processo e do compromisso, abre horizontes e a fé é mais do que um acreditar, Deus não é uma teoria”, diz convictamente.

Para o líder espiritual,  o objetivo é “poder ajudar os jovens a fazer caminho dentro e fora da Igreja, numa vivência de fé”.

Questionado quanto ao futuro, diz que o olha com esperança: “esperança de os jovens poderem ter uma vivência boa. É claro que algumas coisas acabam distraindo, sei lá, as redes sociais, as tecnologias, tudo isso vai diluindo a atenção e o ser-pessoa. O olhar para o jovem com esperança é o olhar resgatando esse ser-pessoa que valoriza as relações humanas não-virtuais. As virtuais também são importantes, acabam criando ligações, mas não criam laços”. 

“Amizades que ficam para a vida”

Jovens tiveram a oportunidade de realizar atividades que permitiram conhecer a ilha de São Miguel © CORTESIA MEJSh

No último dia de encontro, procuramos saber como tinha decorrido a semana, e à conversa com Francisco Marques, 24 anos, natural de Coimbra, este conta-nos que “foi uma experiência única que nos permitiu ter uma abertura a nível da vida cristã e do desenvolvimento pessoal com diversas pessoas, de diversas áreas, de diversos pontos do país”. 

E acrescenta: “conhecemos uma ilha fantástica, foi-nos permitido conciliar o trabalho com o lazer, deram-nos imensa liberdade para que isso acontecesse. Transformou-nos a nível pessoal, a nível de grupo, a nível social, fez-nos refletir sobre problemas atuais da nossa sociedade e tentar criar soluções”. 

De Lisboa veio Pedro Robalo, 28 anos. O participante diz que o “grande encontro é sempre muito intenso” e que “este, em especial, correu muito bem, porque foi uma realidade diferente, na qual nunca tinha existido um, uma realidade muito particular e na qual pudemos aproveitar também os recursos naturais que também estavam muito ligados com o tema da visão cristã do mundo”. 

Por fim, de Vila Verde, em Braga, Mariana Martins, de 20 anos, conclui que o evento “ajudou a conhecer pessoas novas e a criar amizades que ficam para a vida”.

Clife Botelho

Reportagem publicada na edição impressa de outubro de 2022

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